quinta-feira, 23 de março de 2006

Dilema Moral

Ontem me vi diante de um dilema moral que só parece ridículo para aqueles que não são familiarizados com a teoria do caos. Preste atenção.
Caiu sob minha responsabilidade a tutela de um prato de papelão que continha, entre outras coisas, três quindins e quatro brigadeiros. O restante do conteúdo do prato não é importante para nossa reflexão, mas, para satisfação dos completistas, tratava-se de um generoso pedaço de torta de frango com palmito.
A primeira questão mal explicada é a presença destes doces em meu poder, uma vez que não os como. Destino, talvez? Prossigamos com o relato.
Repousei o prato suavemente sobre o banco do passageiro, com o intuito de fazer chegar os doces à minha residência, onde eles seriam divididos entre minha filha e minha esposa. O observador atento já notou que os doces estavam em número ímpar. Como seria realizada essa divisão? Qual das duas seria mais beneficiada? Talvez o que tenha acontecido a seguir foi uma forma do universo corrigir uma injustiça ainda a ser cometida.
Eis que, súbito, o condutor do carro à minha frente pressiona o freio com violência, obrigando-me a fazer o mesmo. Ora, a lei da inércia ordenou ao prato – e aos doces sobre ele - que continuasse sua movimentação. O atrito da superfície áspera do banco sintético do passageiro, contudo, impediu que o prato progredisse muito, refreando sua aceleração.
Porém, oh, porém, o atrito da superfície do prato de papelão foi pífio, e os doces foram arremessados no espaço. Note que uso o termo “arremessados” como figura de linguagem, pois já foi demonstrado que os doces apenas seguiam as ordens da natureza.
Foi neste momento que me encontrei diante do dilema moral supracitado.
Minha mão direita, embora larga, tem um limite de tamanho. Isso significava que, mesmo com meus excepcionais reflexos, não seria capaz de salvar todos os doces da espatifação. Como eles estavam distribuídos simetricamente sobre o prato, ou tão simetricamente quanto possível para elementos em quantidade ímpar, sucedeu-se o impensável: em uma fração de segundos, vi-me obrigado a decidir qual a categoria de doces que deveria salvar, os quindins ou os brigadeiros?
Tanto faz, diria o glutão, mas sou um homem sensível, que entende que são nossas escolhas a matéria-prima do universo. E então?
Salvei os quindins. Decisão tomada no calor do momento. Se tivesse tido tempo para refletir, teria salvo os brigadeiros, pois eles eram quatro e seria mais fácil de dividi-los entre minha filha e minha esposa. Mas ali, no ato-reflexo, atuei como o anjo dos quindins. E você, o que teria feito? E, mais, o que teria significado sua decisão?
Um brigadeiro salvou-se sozinho, por sorte ou habilidade, equilibrando-se na beirada do prato por intermináveis milésimos de tempo, antes de retornar a repousar no fundo do prato. Alguns granulados perderam-se no assoalho, mas apenas um especialista poderia perceber a diferença entre aquele brigadeiro e qualquer outro.
Na hora da divisão, ter quatro doces facilitou o processo. Contudo, durante todo o restante do trajeto até minha casa, tive que suportar a vigília recriminadora daquele brigadeiro solitário entre os quindins. E, posso jurar, ouvi mais de uma vez um sussurro, com ira contida:
— Racista!

Crash

Se você não matou as aulas de metafísica na quinta série... Como? Sua escola não dava metafísica na quinta série? Onde vamos parar... De qualquer forma, todo mundo sabe que o tempo é uma unidade que serve para medir nossa paciência. Quanto menor a paciência, menor o tempo disponível.
Ultimamente, tenho andado meio mal-humorado e, como conseqüência, não tenho tido tempo para fazer quase nada. Por isso, fiquei feliz com minha decisão de aproveitar um tempinho que sobrou para ir ver o Crash, filme ganhador do Oscar.
Primeira coisa: não acreditem nos críticos. Fui ao cinema convencido de que assistiria a uma produção que tratava da América pós 11 de setembro. Erro crasso. O fato do filme ser ambientado nos Estados Unidos é incidental e, apesar de retratar algumas coisas muito ianques, o grosso do recheio é a humanidade que, sim, inclui os americanos, engraçadinho.
Segundo: o roteiro é primoroso e as cenas são recortadas de forma brilhante. As múltiplas histórias são o filme e não estão lá para fazer charme ou parecerem bacanas. É um filho de Pulp Fiction que soube usar a herança do pai.
Terceiro: saí do filme mudado. Não sei em que grau de profundidade ou por quanto tempo, mas passei a ver o mundo com outros olhos. Qual foi a última vez que você pôde dizer isso de um filme?
Quarto: gostei da definição de preconceito que o filme apresenta: ausência. Ausência de informação, de comunicação e de tolerância. Tudo isso tem, invariavelmente, conseqüências, umas mais graves que outras. E tudo isso é preconceito - o conceito que formamos sem saber de toda a história, o que assumimos como verdade, baseados apenas na nossa intuição. Óbvio, não?
Veja o filme.

quarta-feira, 22 de março de 2006

Nomes

Tenho um nome meio estranho, daqueles que naturalmente recorrem a apelido. Um nome que poucas vezes vi acertarem assim, de primeira, seja escrevendo ou falando. De vez em quando, corrijo alguém, mas sou complacente. Entendo que meu Sousa com “s”, mesmo estando gramaticalmente correto, não é o mais comum. Isso para não mencionar os Everaldos, Edmilsons, Emivals, Nivaldos, Perivaldos, Ariovaldos, Emevaldos, Hermínios, Hemivaldos, Edvaldos e Enivaldos. Tudo, menos Emivaldo, meu nome de batismo.
Porém, não consigo lembrar de nenhuma vez que fiz muita questão que meu nome estivesse absolutamente correto (no meu cartão de crédito está “Emilvaldo”, com um L extra – de crédito). Não é indiferença, tenho muito orgulho de ter o mesmo nome que meu pai. E também não sei exatamente porquê não me incomodo. Talvez eu entenda a confusão dos outros já que eu mesmo não sou muito bom com nomes. Bom fisionomista, mas nomes...
Enfim, achei engraçado o festival de e-mails que irrompeu no outlook do trabalho, no qual vários colegas corrigiam a forma como seus nomes eram comumente escritos ou pronunciados. Alguns e-mails foram bem-humorados. Outros, mais taxativos. Nenhum fora de contexto ou equivocado, mas... por que só agora?
Pode ter sido só coincidência, mas parecia que essas pessoas estavam com essas correções represadas, contidas. Um após o outro, os e-mails foram chegando. Não é com H, o C é mudo, é com dois L. Como lemingues atirando-se no mar, os e-mails vieram e continuam a vir, fazendo justiça a, possivelmente, anos de nomes trocados.
Gente, se incomoda tanto, não deixem isso acumular, corrijam sempre que alguém se equivocar – não precisa corrigir todo mundo agora, de uma só vez, pois eu já nem lembro mais quem é quem nessas mensagens. E, se não incomoda, precisa mandar o e-mail?

sexta-feira, 17 de março de 2006

Preso ladrão de Cuecas - Notícia do Globo de 17/03

A vida real é muito mais estranha que qualquer ficção. Vejam este caso: um assaltante, um tal de Edmilson, invade uma casa no Rio de Janeiro e é capturado pelo morador. No bolso do ladrão, duas cuecas infantis.
A polícia, ao prender o sujeito, informa que acredita ter finalmente capturado o misterioso ladrão que, além de dinheiro e eletrodomésticos, roubava também as cuecas de suas vítimas. Ultimamente, vários furtos na vizinhança haviam tido essa característica: iam-se os bens e as cuecas.
Não acabou. O meliante tinha dois cúmplices, que não conseguiram ajudar o companheiro pervertido pelo simples fato de que sequer sabiam que ele havia sido capturado pelo morador. O seqüestrador de cuecas não clamou por ajuda porque é mudo. Isso mesmo. Trata-se de um mudo, tarado e criminoso, não necessariamente nesta ordem.
Tarado, sim, pois se fosse simplesmente falta de dinheiro para cuecas, porque não levar também blusas, calças, meias, perfumes e as escovas de dentes das vítimas?
O que não foi divulgado, para não alarmar a população, é que os cúmplices foragidos também têm lá suas manias. Além das cuecas, foi observado também o desaparecimento de comida para cachorro e palitos de dente, indícios fortes de que os demais criminosos se tratam de Inácio Cabecinha e Ramiro Pedrosa, o Coruja. O primeiro, maneta perigosíssimo por ter adaptado peixeiras aos seus cotocos e o segundo, cego de nascença e meio devagar das idéias, também é perigoso, pois está sempre armado e não sabe pra onde está indo, pra onde está mirando e nem o que está acontecendo.
E é o mesmo mundo no qual você vive, leitor. O mesmíssimo.

Mulheres Despudoradas

A modernidade e a abertura do diálogo sobre sexualidade devem ser vistas como uma boa coisa, especialmente para as mulheres, que vêm conquistando, a cada dia, mais direito à informação e ao gozo, cobrando de seus parceiros cada vez mais dedicação e criatividade. Estou dentro. Nada contra suar a camisa para agradar a parceira. Camisa metafórica, claro, pois nessas ocasiões estamos normalmente sem camisa.
O que me incomoda é o exagero, esta condição sempre presente em tudo que envolve o ser humano. Não estou dizendo que está errado, mas que me incomoda, incomoda.
Mulheres que discutem o tamanho dos pintos dos parceiros em praça pública, dão notas para performances aos quatro ventos e transam sem envolvimento apenas para quebrar a monotonia, para mim, perdem muito de sua feminilidade porque... Ora, porque parecem homens.
Sei muito bem que isso é apenas comportamento e não define gênero ou preferência sexual e que meu incômodo é fruto de uma mentalidade machista enraizada no cerne da sociedade, patati, patatá, etcétera e tal. Mas isso não muda o fato de que eu não seria conquistado nem mesmo pela Ana Hickman se ela virasse para mim e dissesse, sem mais nem menos:
— E aí? Vamos foder?
Como diria o Pipi*, eu comeria, mas não seria conquistado.
Você vai dizer, seu insensível, que a intenção da Ana era justamente essa. Ela não estava a fim de uma conquista ou relacionamento amoroso, ela queria apenas me usar para uma noite de sexo intenso e selvagem em todas as posições do kama sutra, duas vezes cada. Mas o meu ponto de vista é que... Hmm... Pensando bem, acho que posso viver com isso.
* Se você não conhece o divertidíssimo blog português O Meu Pipi está perdendo tempo - é bem melhor que o meu.

quarta-feira, 15 de março de 2006

Enquetes

A popularidade do site Kibeloco me impressiona. É uma popularidade merecida, pois as piadas são realmente engraçadas, mas não é menos impressionante por causa disso. Veja o exemplo das enquetes de Internet.
Essas enquetes nunca foram lá muito confiáveis, pois a opinião de quem navega nos sites que as promovem nem sempre é a opinião de todos. Quem não sabe que a enquete está lá, não vota, como foi o caso da pesquisa da FIFA que elegeu Maradona como o melhor do mundo. No Brasil, pouca gente sabia que a tomada de opinião existia enquanto que, na Argentina, um jornal divulgou a notícia e conclamou a população a votar no baixinho doidão.
O Kibeloko, inspirado por essa iniciativa, resolveu interferir em todas as enquetes da rede, conclamando seus leitores a votar nos resultados mais improváveis do mundo. Duvida? Veja os exemplos. O mais sexy do Big Brother é o sujeito que parece o Dino da Silva Sauro. Senna ganhou de Schumacher como melhor piloto do mundo em pesquisa feita por um site alemão (isso é até verdade, mas os alemães não devem ter entendido nada). Vingança: na enquete de jornal Argentino, só deu Brasil como o favorito da copa. E, nesta segunda-feira, em apenas uma hora, o site conseguiu esculhambar a votação do gol mais bonito da rodada do Linha de Passe da ESPN. É ou não é impressionante?A verdade é que, com o Kibeloco em ação, não tem credibilidade que resista.

Games

Em uma análise medíocre do meu site, pude perceber que já escrevi várias vezes sobre quadrinhos, inclusive nas duas últimas crônicas.
Nada mais natural, uma vez que se trata de um dos meus passatempos preferidos. Não deve ser, porém, um tema de interesse dos meus leitores, que nunca se manifestaram a respeito dessas crônicas sobre HQ.
Tudo isso me fez perceber que tenho dedicado pouco tempo de escrita para outro de meus hobbies herméticos e alienantes, o videogame. Bom, como não sou homem de cometer injustiças, escreverei primeiro sobre videogame e, em segundo lugar, verei o que posso fazer para melhorar a audiência do site (talvez retomar o projeto de incluir fotos de mulheres nuas ao lado das crônicas... vou ver). Videogames, então.
Como é a primeira vez que escrevo sobre eles, vamos logo metendo o pé na porta. Com vocês, os melhores videogames de todos os tempos.
Under a Killing Moon – Este jogo começou tudo. Mal sabia para que servia um computador e, depois de instalar a segunda aventura do detetive Tex Murphy no PC do sogrão, foram horas e mais horas de investigação e risadas. Era um jogo de aventura, com um detetive cínico em um cenário pós-apocalíptico. Genial. Depois joguei, do mesmo personagem, o Pandora’s Directive e um outro, que me fugiu o nome. Bom mesmo foi o primeiro.
A Série Monkey Island – Nada supera o já mundialmente famoso duelo de insultos.
Sam e Max Hit The Road – O mais engraçado de todos. Um cachorro bonachão e um coelho psicótico compõem a dupla de detetives mais bizarra de todos os tempos. Para resolver o desaparecimento do Pé Grande, eles visitam lugares como um circo de horrores e a maior bola de lã do mundo. Inesquecível a cena que os dois entram no túnel do amor, a tela fica escura e depois, quando saem, acontece o seguinte diálogo:
SAM: Tenho certeza de que a gente deveria ter feito alguma coisa a mais lá dentro.
MAX: Mas era o nosso primeiro encontro!
Max, na verdade, estava querendo dar uma dica de que o jogador deveria fazer alguma coisa para dar andamento ao jogo e...Bom, é mais engraçado vendo que explicando.
A série X-COM: tenho que confessar que já dei mais de um gritinho histérico no meio da noite quando eu mandava o soldado olhar para trás só para perceber que tinha um alien cabeçudo atrás dele o tempo todo. Foram horas investidas em salvar o mundo de uma invasão alienígena. De nada.
DUKE NUKEM 3D: “Eu vim aqui pra chutar bundas e mascar chiclete – e acabou o chiclete!”. Precisa dizer mais alguma coisa?
BLADE RUNNER:Cada vez que você jogava, o vilão mudava. E reproduzir em casa o efeito de ampliar uma imagem fotográfica usado no filme ... Do caralho!
FINAL FANTASY 7: Quase chorei quando o vilão mata um dos personagens principais. Inesperado e envolvente, foi um dos primeiros jogos com narrativa cinematográfica.
PLANE SCAPE TORMENT: Você começa o jogo em um necrotério, sem saber quem você é e como foi parar lá, como se estivesse morto. À medida que o jogo progride, você define a forma como ganha suas memórias e como o seu passado é recontado. Ao final do jogo, cada pessoa terá recontado a história de maneira diferente.
DIABLO 2: Ninguém sai enquanto não matarmos o Diablo. O jogo é mais viciante que poker.
A série WINNING ELEVEN: Quem nunca jogou uma partida de Winning Eleven com um grupo de amigos ainda não experimentou um dos maiores prazeres da vida. Eu disse “um dos maiores” e não “o maior”, por isso, nada de piadinhas sobre minha vida sexual. Paro por aqui. É impossível fazer uma lista dos melhores games. São muitos e eles são bons por diferentes motivos. Deixo aí esta lista parcial e, se tiver tempo, vou completando.

sábado, 11 de março de 2006

Excelsior


Por onde começar? Sexta-feira assisti ao filme do ano. Tudo bem que ainda não vi quase nada do Oscar e ainda estamos em março, mas vai ser difícil algo superar o documentário de Kevin Smith que vi no Cinemax.
Smith, cineasta e roteirista de HQ, responsável pelo extraordinário retorno do Arqueiro Verde, entrevistou ninguém menos que Stan Lee, diretor de criação da Marvel Comics e o criador do Homem-Aranha, Thor, Hulk, Vingadores, X-Men e Quarteto Fantástico, só para citar os mais conhecidos.
O cenário da entrevista foi, apropriadamente, uma comic shop e durante quase duas horas fiquei hipnotizado vendo aquele senhor de oitenta anos falar sobre histórias em quadrinhos, torcendo para que a conversa não chegasse ao final.
Para alguém que proclama que é um grande fã de si mesmo, Lee mostrou ser extremamente simples, humilde, honesto e um imenso brincalhão, revelando sem frescuras ou pudores todos os segredos da indústria de quadrinhos e como foi o processo de criação de cada um de seus personagens. Algumas histórias são inesquecíveis.
Como escrevia literalmente dezenas de revistas ao mesmo tempo, Lee tinha dificuldade de se lembrar dos nomes de seus personagens, por isso a maioria deles tem iniciais duplas. Peter Parker, Reed Richards, Susan Storm, Bruce Banner... E por aí vai.
Os heróis da DC, rival da Marvel, têm origens diversas. Superman é de outro planeta, Batman criou-se por causa de uma tragédia, Mulher-Maravilha é uma semi-deusa grega. Mas os heróis de Lee têm, quase todos, origens baseadas na ciência e na tecnologia – e Lee explica porquê: ele era fã de ficção científica. O detalhe é que, apesar disso, não tinha nenhum conhecimento de ciências e, segundo ele próprio, não sabe diferenciar uma bomba gama de um abacate. Os fenômenos que criaram o Quarteto Fantástico (raios cósmicos), o Hulk (bomba gama) e o Homem-Aranha (aranha radioativa) tiveram esses nomes porque Lee achou que eles soavam bem. Tinham uma sonoridade legal. Não havia pesquisa ou lógica envolvidos no processo.
Para Lee, inventar a forma como os personagens tinham adquirido seus poderes era, inclusive, muito chato. Ele queria era desenvolver personalidades e não se ocupar do pano de fundo. Finalmente, sem idéias para novas origens secretas, decidiu que ia criar um grupo de heróis que já tivessem nascido com poderes – mutantes. Nasceram os X-Men – que foram batizados assim porque o editor da Marvel na época achou que “mutante” era uma palavra que a população não compreenderia. Como se alguém fosse saber o que significa X-Men...
Na década de sessenta, Lee andava chateado com a Marvel, pois os editores não deixavam que ele desenvolvesse suas idéias. Achavam que quadrinhos era coisa de criança ou de adultos bobos e impediam que ele fosse mais ousado. Lee andava insatisfeito e entendia que estava escrevendo apenas bobagem. Em uma tentativa de ser demitido, criou o Quarteto Fantástico, juntando em uma única revista tudo que era “proibido”. Heróis sem identidade secreta, muito texto, histórias com continuação, crítica política, drama familiar. As revistas venderam tanto que, em vez de ser demitido, Lee foi promovido a presidente da empresa, cargo que ele declinou dois anos depois, para voltar a criar histórias. “Eles queriam que eu fizesse um planejamento para os próximos cinco anos e eu não sabia nem o que eu ia comer no almoço”.
Humildemente, Lee afirmou que todo o seu sucesso foi apenas sorte. “Sou um bom contador de histórias, mas existem melhores. Tive a sorte de trabalhar com os mais incríveis desenhistas da minha época, Jack Kirby, Gene Colan, Steve Ditko, John Buscema. Houve um momento na história no qual tudo o que fazíamos parecia dar certo, mesmo quando errávamos”.
Modesto, Lee pareceu esquecer que suas estratégias de marketing são as linhas mestras da indústria de quadrinhos até hoje, como a introdução da sessão de cartas dos leitores e os recordatórios, no início de cada história, que falam um pouco sobre o herói e atualizam o leitor da trama. “Mas isso não é redundante?”, perguntou Kevin Smith, “Todo mundo sabe quem é o Homem-Aranha”. Ao que Stan Lee respondeu, com um sorriso: “Tenha sempre em mente que toda revista em quadrinhos é sempre a primeira revista em quadrinhos de alguém”. Se eu já não fosse fã, teria virado.

quarta-feira, 8 de março de 2006

Progresso

Não é só a Igreja que sofre e é obrigada a rever seus fundamentos à medida que o tempo passa e a ciência evolui. É o caso também de alguns personagens de quadrinhos, como Slade Wilson, o Exterminador.
É claro que tanto os quadrinhos quanto a Igreja sempre se valeram de impossibilidades científicas, mas até aí tudo bem. Longe de mim questionar a água que vira vinho, o caminhar sobre as águas, a combustão do Tocha Humana ou a rigidez do adamantium. Na verdade, fé e fantasia são duas coisas muito parecidas, o que separa uma da outra é apenas a credibilidade do interlocutor.
Mas as coisas ficam chatas é quando fica provado, por A mais B, que uma teoria não é apenas improvável – é errada. Pelo lado da Igreja temos o caso do Giordano Bruno, que foi excomungado porque, entre outras coisas, defendia que a Terra não era o centro de tudo e que o Universo era infinito. Queimaram o cara, que, infelizmente, não virou o Tocha Humana, morreu mesmo. Toca a pedir desculpas, fizeram um filme, etc.
Nos quadrinhos, fica o exemplo do Slade. O Exterminador foi criado para ser inimigo dos Novos Titãs (o grupo que abrigou o Robin depois que ele largou o Batman). Era um mercenário que, ao contrário dos seres humanos normais, usava 100% do cérebro e que havia treinado incansavelmente para ampliar seus reflexos. O problema é que, dos anos 80 para cá, já se descobriu que essa história de que usamos apenas uma parte do nosso cérebro é pura balela. Todo mundo usa 100% do cérebro. Pegou mal pro Slade, hein? Agora, como é que fica?
Além disso, ninguém pode treinar para melhorar o reflexo, pois reflexo é involuntário. Podemos treinar para melhorar o nosso tempo de reação... Mas aí já é ser detalhista, o que pega é o negócio do cérebro.
Em tempo: pode ser que o exemplo do Giordano Bruno não seja dos melhores, pois o filósofo tinha outros pontos de discordância com os dogmas da Igreja, que são polêmicos até hoje, como a virgindade de Maria. Mas o fato é que suas crenças em diversos sistemas solares eram também foco de suas atribulações com a Igreja.
Enfim, o que eu queria demonstrar com isso tudo é que informação demais acaba com a alegria de muita gente. Eu, para citar outro exemplo, adorava ir ao McDonald’s, mas depois que assisti ao Supersize Me, issso mudou. Continuo indo, mas agora isso me deprime.

terça-feira, 7 de março de 2006

Mulher

Fazia tempo que não me pediam para escrever uma crônica específica. Por um momento, cheguei a pensar que não tinha mais ninguém lendo isso aqui e não existe nada mais solitário e deprimente que ficar falando sozinho pela internet – é falar sozinho em escala global. Mas, feliz ou felizmente, me pediram para fazer uma crônica curta sobre a mulher. Só agora me ocorreu que eu deveria ter perguntado para que era. Enfim...

Em primeiro lugar, abandonemos o politicamente correto, que limita as diferenças de gênero a questões científicas e, portanto, desprovidas de qualquer poesia. E, para mim, é inadmissível falar da mulher sem poesia.
Agora, imaginemos, por um segundo, o mundo sem as mulheres. Apesar da sensação inicial de alívio, não é preciso ser gênio para constatar que, em longo prazo, teríamos problemas. O homem, por exemplo, jamais seria capaz de assumir a questão prática de botar filhos no mundo para manter a espécie humana em atividade. Primeiro, porque é egoísta. Segundo, porque não é lá muito tolerante à dor e, terceiro, porque é muito racional e acabaria chegando à conclusão de que não vale a pena e que o melhor mesmo é que o mundo se acabe. Especialmente, um mundo sem mulheres.
Caos deveria ser um substantivo feminino, pois foi o caos a mãe do universo e está ele também na essência de todas as mulheres. A mulher é o que, ao mesmo tempo, nos enlouquece e nos conforta, nos destrói e nos levanta. É uma doença cujo remédio é ela própria. No fim, imaginar um mundo sem mulheres é como imaginar uma moeda com apenas uma face, uma impossibilidade física.
A mulher é isso. Algo impossível que, no entanto, existe. O que corrobora aquela outra teoria da evolução que afirma que o homem foi criado por um engenheiro e a mulher, por um artista.

segunda-feira, 6 de março de 2006

Especial Oscar 2006

Não é segredo para ninguém que o Oscar é uma cerimônia criada pela indústria do cinema para perpetuar a indústria do cinema. Uma orgia de lobby, dinheiro, vaidade e futilidade. É o capitalismo fazendo um bundalelê para o comunismo e dizendo “eu venci”. Isso não muda o fato que ainda trata sobre cinema e que cinema ainda é arte. Os pingüins franceses e a surpresa da noite, Crash, que o digam. Outra surpresa, que mostra que o conceito de arte evolui (ou, pelo menos, muda) foi a vitória do rap na categoria de melhor música.

O melhor momento do Oscar foi a entrega do prêmio honorário a Robert Altman, um dos poucos diretores ainda vivos dignos do título de cineasta. Seu discurso foi, ao mesmo tempo, doce, ácido e comovente. Cheio de nuances e camadas como os filmes do próprio diretor. Destaque especial para a apresentação do prêmio, feita por Meryl Sreep e Lily Tomlin – inesquecível.

Paradoxal e idiossincrática, a cerimônia deste ano estava politicamente correta. O discurso de Michael Moore que escandalizou metade da platéia há dois anos atrás estaria mais apropriado neste ano – o que prova duas coisas. A primeira, que Moore já estava correto há dois anos atrás e a segunda, mais sutil, é que o capitalismo é implacável e transforma tudo em negócio, até mesmo as causas políticas e sociais com rapidez e eficiência – o movimento hippie que o diga.

Mas foi uma cerimônia mais transparente que outras. Os próprios organizadores fizeram piada com o lobby necessário para se criar um ganhador. O que não estava tão transparente, para minha infelicidade, foi o vestido das gostosas. Aliás, não me incomodaria em ver a Jessica Alba e a loirinha do Orgulho e Preconceito sem vestido algum.

Em um surto súbito de honestidade, encerro meus comentários sobre o Oscar declarando minha inveja do George Clooney. Ser bonitão, famoso, milionário e respeitado é até normal na turma que ele anda, mas ele foi além. Uma moça que ganhou um Oscar sei lá de quê, em vez de agradecer papai e mamãe, agradeceu à organização do evento por tê-la colocado sentada ao lado de George Clooney no jantar. Ou seja, a mulher ganhou um Oscar, mas importante mesmo foi ter sentado ao lado do cara. Moral é isso.

sábado, 4 de março de 2006

Pretextos para não assistir a O Segredo de Brokeback Mountain

Fato: todo machão ou pseudo-machão que se preze não vai assistir ao filme dos cowboys gays. Isso não é problema quando se é preconceituoso assumido, pois basta afirmar que é tudo coisa de veado e pronto. Porém, se a pessoa for moderninha, metrossexual ou tiver uma porção de amigos gays, é preciso ter uma desculpa na ponta da língua, que não seja preconceituosa ou discriminatória. Aqui vão minhas sugestões.
1. Não gosto de romance. Também não estou animado para ver Orgulho e Preconceito, que está no Oscar, tem uma fotografia belíssima e uma loura gostosa no papel principal.
2. Não é o tipo de filme que vai estimular meu lado sensual. Nada contra, mas se fosse alugar um filme de sacanagem, por exemplo, não seria uma produção gay. A Denise Richards nua me atrai, o Ledger, não.
3. O filme me parece que está mais apoiado em sua polêmica que na história em si, que se desenvolve lentamente e, como disse antes, não faz meu estilo.
4. Se achasse que o filme fosse me agradar, não seria um relacionamento gay, com beijo ou sem, que me impediria de assisti-lo. Vi o Relatório Kinsey e não saí do cinema, não virei o rosto com nojo e nem fiquei com tesão. Fiquei surpreso com a cena, mas achei que tinha a ver com o contexto do filme.
Considero essas desculpas, separadas ou em conjunto, ótimas para pôr fim a qualquer discussão sobre preconceito, mas é claro que se a gente não for preconceituoso mesmo não precisa ficar se justificando, certo?

sexta-feira, 3 de março de 2006

Oscar

A melhor cerimônia do Oscar que assisti foi há alguns anos atrás, quando tive uma febre de 45 graus e delirei durante toda a apresentação. Vi a Fernanda Montenegro agradecer, em inglês macarrônico, pelo prêmio de Melhor Atriz. Vi a Whoopi Goldberg fazer um streeptease nada sensual, mas não menos impressionante por causa disso. E vi uma confusão envolvendo o Pé Grande, o Sílvio Santos e uma calcinha preta. Quase morri, mas valeu a pena.
Neste ano, o Oscar está todo politicamente correto, com gays e oriente médio saindo pelo ladrão. Arrisco-me a dizer que nem é o Oscar, é o mundo que está assim. A arte é por onde a humanidade sangra e a hemorragia é tanta que alcançou Hollywood.
No mundo globalizado estamos rápidos para refletir e ainda mais velozes quando o assunto é esquecer o que foi refletido, mas, no apagar das luzes, parece que andamos tendo algum progresso. Ao menos, no apagar das luzes do cinema.

Vida quase real

Caiu a máscara. E o que é pior: foi a minha. Mas, antes de continuar, chamo a atenção do leitor, que pode ter a mente embotada pelo deleite carnavalesco, para as minhas esforçadas analogias com a festa de momo. “Caiu a máscara”, no início deste texto e “fantasias”, como no título da postagem anterior. Estamos impossíveis.
Mas, voltando ao assunto, justo eu, crítico inveterado dos reality shows, me peguei assistindo – e gostando – de mais um do gênero, o American Idol. Não é a primeira vez que vejo o programa. Já havia acompanhado, em segredo, as finais da edição anterior, quando torci pelo roqueiro cabeludo, vice-campeão. A vencedora foi uma loirinha angelical, na voz e no rosto.
Há alguns anos atrás, passei os olhos na versão tupiniquim da Globo, com a apresentação da Angélica e de um esforçado Toni Garrido. Não gostei. Fiquei com a impressão de que a emissora investiu demais no drama e de menos na música, e o conflito de personalidades que é tão adorado pelos fãs do gênero é justamente o que me causa repulsa. Na versão americana é a música que manda.
Tá certo, a primeira fase do programa é tão divertida quanto deprimente, com quase todas as babaquices tradicionais de um reality show. Mas as finais são cheias de interpretações interessantes e surpreendentes e os comentários do “cachorrão” Randy Jackson são ótimos, assim como as “falsas” discussões entre Paula Abdul (lembra dela?) e um gay mal-humorado chamado Simon.
Ontem fiquei impressionado com um moleque de dezesseis anos que, se continuar treinando, vai longe e com um japonês que cantou corajosamente Reasons do Earth, Wind and Fire. Nenhum dos dois vai muito longe na competição (o japonês já foi até desclassificado ontem mesmo). O menino porque não está no mesmo nível dos melhores – estaria, se fosse mais velho, mas não está. E o japonês porque é feio pra danar e, em um programa de votação popular, boa aparência é obrigatório.
De quebra, pude conferir versões ensandecidas de Copacabana e Shout que arrancariam risos do mais estóico dos carrancudos.
Bem, mais um para a lista das exceções. Agora são três os reality shows que assisto. Queer Eye For The Straight Guy (porque é engraçado e não humilha ninguém), America’s Next Top Model (porque é recheado de mulheres lindas e seminuas) e American Idol. O resto continuo desprezando até prova em contrário.

Fantasias

Um amigo me contou, em uma conversa incidental, daquelas que não sabemos como começou e nem onde pode parar, que, certa feita, uma namorada disse para ele o seguinte:
— Prefiro que você me traia fisicamente que em pensamento.
— Por quê? – Ele perguntou, estranhando o raciocínio.
— Porque a imaginação é ilimitada.
A frase tem lá o seu efeito e sua lógica, mas, na prática, tenho cá minhas dúvidas. Uma coisa é querer matar alguém, outra completamente diferente é sujar as mãos de sangue. Contudo, se colocarmos minhas metáforas violentas de um lado e o exagero da namorada do amigo de outro, o que sobra é a constatação da moça de que a traição, em qualquer uma de suas formas, é algo desagradável. Mas, trair em pensamento é assim tão ruim?
Se o pensamento for um plano, uma meta ou uma obsessão tenho certeza de que é péssimo, pois a única coisa que separa essa idéia de sua concretização é a oportunidade. Mas se a traição estiver no terreno da fantasia, brincando entre o consciente e o inconsciente, não só acho que não é tão criminoso, como, me arrisco a dizer, deve ser normal e até saudável.
Fantasia, no relacionamento, é acessório. E não me refiro apenas às de enfermeira e de bombeiro que são vendidas nos sex shops (me contaram), embora essas também auxiliem nesse processo de falsa traição, onde todo mundo finge ser o que não é e imagina o outro como se fosse... Bem... Outro.

quinta-feira, 2 de março de 2006

No creo en las brujas, pero que las hay...

Sou um cético fervoroso. Cultivo verdadeiro prazer em duvidar das coisas, aceitando apenas que existem fenômenos para os quais ainda não achamos explicação. Já vi as mesmas esquisitices serem explicadas de forma diferente por católicos e espíritas, o que me deu a impressão de que nenhuma das duas explicações era satisfatória.
Curiosamente, fui alvo recentemente de duas artes divinatórias de origens distintas – e recebi o resultado das duas com carinho e bastante respeito. Afinal, as informações vieram de pessoas que, em princípio, me querem bem, não cobraram nada pelo serviço e não estavam tentando me provar absolutamente nada.
Uma teve origem espírita, foi realmente uma espécie de previsão do futuro e incluiu boas e más notícias (não se pode ganhar todas, certo?).
Outra teve origem na astrologia e foi mais um retrato da minha personalidade que qualquer outra coisa: o meu mapa astral. Sempre tive simpatia pelo dicionário de arquétipos da astrologia e do tarô, pois acho fantástica a facilidade com que conseguimos nos enxergar em suas descrições. Acho tudo mais psicológico que místico, mas não menos fascinante por causa disso. E, embora doa a um cético ter que admitir tal coisa, meu mapa astral foi particularmente preciso, com apenas um ou outro tiro n’água.
Tenho uma certa bronca com a predestinação, pois acho uma justificativa fácil para nossos erros. “Não fui eu, foi o destino”, “estava escrito”, “tinha que ser assim”. Enfim, consolo para o inexplicável. Mas entendo perfeitamente a ânsia de saber melhor quem somos, qual nosso papel no mundo e, se der, os números do próximo sorteio da sena.

Depressão pós-carnavalesca

Parece que muito assunto digno de crônica aconteceu enquanto eu estive fora. Dois shows internacionais, o beijo do Bono na Katilce e, é claro, o carnaval. É muito circo para nos ajudar a esquecer a falta do pão – e das eleições logo mais.
De tudo isso, só lamento não ter visto mais peitos e bundas neste carnaval. Em tese, sou contra essa objetificação da figura feminina, a exploração dos sentidos e a dessensibilização do erótico, mas, na prática, sempre gostei de peitos e bundas e de sua oferta, com o perdão do trocadilho, abundante, nesta época do ano.
Não entrei no clima e acabei indo fazer outra coisa à noite, em vez de acompanhar os desfiles. Não peguei nem mesmo as reprises, em horários mais complacentes. Agora, estou correndo atrás do prejuízo e tentando ver, na Internet, o que perdi, mas não é a mesma coisa. Sinto falta, nas fotos, do balançar natural dos seios e das bundas, eles próprios cada vez menos naturais, e os vídeos na web são pequenos e em baixa resolução. Paciência.
Tivesse eu ainda meus quinze anos, isso jamais teria acontecido, já que meus hormônios não o teriam permitido. Por outro lado, a oferta de peitos e bundas aumentou substancialmente de lá para cá. Não sei dizer se estou mesmo mais velho ou se já estou realmente um pouco entorpecido, efeito colateral do exagero. Talvez um pouco dos dois.
De qualquer forma, pelo menos uma coisa era mais ousada em minha adolescência: a transmissão dos bailes de carnaval da Manchete e, depois, da Bandeirantes. Aquilo, sim, era uma putaria digna de ficar acordado madrugada adentro. Totalmente politicamente incorreta e despudorada, com direito a genitália desnuda e tudo mais. Bons tempos, bons tempos. É claro que digo “bons tempos” no sentido figurado, aquilo tudo era uma libertinagem sem tamanho e não era apropriado à TV, mas, fica aqui a sugestão, e TV a cabo? Olha a oportunidade aí, gente.
Chamem-me de sexista, de Calígola, de tarado, mas o fato é que estava experimentando uma certa depressão pelo fato de não ter sido exposto à minha dose usual de peitos e bundas. Comprei a Playboy e a Sexy e já estou me sentindo melhor, mas, como já disse, não é a mesma coisa.

quarta-feira, 1 de março de 2006

O Seqüestro

Fui seqüestrado. Até prova em contrário, ser mantido em cativeiro, sem contato com o mundo exterior e contra a vontade é seqüestro, mesmo que não envolva pedido de resgate.
A polícia costuma alertar que, nesses casos, alguém próximo pode estar envolvido e eles não poderiam estar mais corretos: o responsável pela minha abdução foi meu próprio pâncreas. Mas ele, claro, não operou sozinho.
A operação contou com a colaboração do meu sistema imunológico e, possivelmente, do meu sistema nervoso parassimpático, apesar do envolvimento deste último não ter sido comprovado. Não é a primeira vez que meu pâncreas tenta me tirar de circulação, mas essa foi uma de suas investidas mais eficientes. O desgraçado só não foi preso porque seus advogados são excelentes – sempre alegam que ele estava sob a influência de drogas pesadas, como insulina e metformina.
Fui bem tratado no cativeiro. Alimentação frugal, mas constante (seis vezes ao dia) e pude, inclusive, receber amigos e usar o telefone de vez em quando, mas minha conexão com a Internet foi cortada. O pâncreas nega, mas é possível que ele estivesse envolvido também neste incidente. Existem indícios que apontam seu envolvimento com o raio que caiu em meu prédio, mas a Natureza nega e diz que nunca o viu mais gordo.
Enfim, estou livre novamente e de volta ao blog e, se depender de mim, por muito tempo, mas você sabe como são os órgãos internos hoje em dia... Incorrigíveis.