quinta-feira, 26 de junho de 2008

Pílulas de sabedoria

Era um sábio. Disso ninguém duvidava. Tinha até a barba branca, a postura sóbria e o olhar contemplativo para provar. Se perguntassem para qualquer um, qualquer um diria: trata-se de um sábio.
Mas o sábio tinha um problema: ninguém ouvia seus conselhos.
É que diferente dos charlatães, que normalmente diziam o que os outros queriam ouvir, o sábio falava apenas a incômoda e desconfortável verdade.
Combinaram então o seguinte: cada um perguntava para o sábio apenas sobre a vida dos outros, que assim poderiam ouvir as opiniões brilhantes do sábio sem se preocupar em olhar para o espelho.
Era um sábio. Mas como só falava dos outros, ficou com fama mesmo é de fofoqueiro.

Moral: Sabido mesmo é quem fica na sua. A vida dos outros, é, pasmem, só dos outros.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Comentando o comentário

O Fred deixou um comentário interessante no post “Põe aqui o seu pezinho”(vá lá ler), mas acho que ele não entendeu muito bem o que eu quis dizer. Tudo bem, eu mesmo não me entendo na maioria das vezes.
Pra jogar luz sobre a questão, imprimi o texto e mostrei para o surdo-mudo que trabalha aqui com a gente e ele me explicou, em linguagem de sinais (que também não entendo), o que eu quis dizer. Foi o seguinte:
Todos nós sofremos pressões sociais e todos nós nos adequamos, em maior ou menor grau. O sapato é apertado pra todos, mas para alguns, é mais apertado e, para outros, o aperto é mais insuportável.
Enquanto uns se contentam em tirá-los no fim do dia e beber uma cerveja com o pé pra cima, outros tiram logo a roupa toda, dançam rumba sobre a mesa de centro, tomam banho com o gato, filmam tudo e colocam no Youtube. E o que me chama atenção é que tem cada vez mais gente fazendo isso – não apenas escrevendo blog ou se relacionando pela Internet, mas fazendo uma auto-análise sem limite e sem critério, expondo-se ao ridículo para a avaliação dos outros.
Acho que essas pessoas estão, de certa forma, mostrando as suas cicatrizes, assim como a gueixa que divulgou o seu pé atrofiado na internet.
Porém, concordo que não são apenas pressões culturais e sociais que deixam cicatrizes. Desilusões amorosas, catástrofes naturais, guerra e assistir o Faustão do começo até o final são coisas que já provaram seu poder de destruição da alma humana mais de uma vez.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Louras e BFG

Toda vez que posso escolher um personagem antes de iniciar um videogame, opto por uma mulher. O motivo é bem simples: a maioria desses jogos é em terceira pessoa e, se vou ter que olhar para a bunda de alguém por horas a fio, porque não uma mulher? Se tiver uma roupinha apertada ou praticamente roupa nenhuma, melhor ainda.

Sexista? Só se eu revelar minhas verdadeiras intenções. Minha filha, por exemplo, acha que minha preferência por mulheres mostra que tanto homens quanto mulheres podem brincar com bonecas, que é bobagem achar que meninos só podem brincar de carrinho.

Voyeurismo juvenil e educação moderna ao mesmo tempo não é para qualquer um. Não tente fazer isso em casa sem a ajuda de um especialista.

Mas voltando ao assunto: na falta de mulheres, opto pelo bárbaro. O cara mais grosso, escroto e forte disponível. Os psicólogos de plantão podem achar que estou querendo reafirmar minha masculinidade. Mas eu posso garantir que reafirmar a masculinidade jogando RPG é meio perda de tempo. É que o cara estúpido normalmente tem as melhores falas, como a clássica “Eu vim aqui pra dar porrada e mascar chiclete. E acabou o chiclete!” do Duke Nukem.

Tem sempre também o velho que curte magia e uma magrela (ou baixinha) que gosta de andar pelas sombras. Às vezes tenho que optar pela magrela, especialmente quando não há uma outra personagem feminina presente, mas o bom mesmo é quando consigo juntar o fetiche do personagem feminino com a diversão que um personagem casca-grossa representa.

No RPG Mass Effect, a comandante Sheppard, que escolhi, não apenas mandou o presidente do conselho galáctico se ferrar, como adorava freqüentar boates de strip-tease. Além disso, perto do fim, ela “apertou” a alienígena mais gostosa do jogo. E a bundinha da Sheppard não era nada mal...

Mas nada se compara a Seraphin, a anja peituda de Sacred. Todas as armaduras disponíveis para ela eram basicamente versões diferentes de calcinha e sutiã, seu feitiço preferido se chamava BFG (Big Fuckin’ Gun, para os não-iniciados), uma de suas frases mais legais era: “isso aí é sua espada ou você está feliz em me ver?” e sua marca registrada era gargalhar loucamente sempre que um golpe seu arrancasse a cabeça do adversário.

Psicótica, linda e politicamente incorreta, Seraphin vai estar de volta no fim do ano, com o lançamento de Sacred 2. Nessa era do politicamente correto, quer apostar quanto como vão enquadrar a anja? Já comecei o abaixo assinado pra mandar pra produtora!

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Põe aqui o seu pezinho

Como metade das pessoas que têm computador, eu também recebi o e-mail bizarro da velha gueixa com o pé completamente atrofiado e deformado. Com uma mistura de orgulho e tristeza, a senhora mostrava o estado pé, com os dedos dobrados, peito do pé estufado e, como último recurso, o tendão cortado. Tudo para conseguir calçar um sapato número, sei lá, 29? 28?

O sapato era pequeno, mas é o que menos importa nessa história. O que importa é o seguinte: até onde estamos dispostos a ir para sermos aceitos? No caso da senhora japonesa, ela suportou uma imensa violência física por conta de determinadas pressões culturais e sociais. Mais freqüentemente, nós nos submetemos a algumas violências psicológicas para subir na vida e para ser convidado para as festas.

Às vezes nem percebemos e, outras, levamos na brincadeira. São as demandas do chefe chato, o terno de segunda à quinta, o sorriso amarelo diante do desafeto que casou com sua melhor amiga, o aniversário da tia inconveniente. Pressões sociais e culturais que, pensamos, não significam nada e, afinal, precisam ser obedecidas, sob pena de ostracismo ou, pior, indiferença.

Mas quando vejo essas páginas pessoais do Orkut e afins, com gente tirando a roupa, declarando que faz sexo com plantas e exibindo sua vida pessoal de forma explícita, me pergunto se essa onda de mostrar as cicatrizes na Internet já não tem um tempo. É que algumas cicatrizes são mais visíveis que outras...

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Pro buraco

Por falar em pessimismo, nesse exato momento, em um túnel gigante embaixo de um lugar qualquer na Europa, tem um grupo de doidos com PhD acelerando partículas e mandando umas de encontro às outras em velocidade dez vezes superior à da luz. Eles fazem isso o dia inteiro e ficam lá, sentados, pra ver o que acontece.

Até aí, nada demais, pensa o desavisado. Melhor que assistir ao Big Brother deve ser.

O único problema é que o passatempo desses rapazes pode ter um pequeno efeito colateral: a criação de um buraco negro.

Sim, aquele mesmo tipo de buraco negro que, por ter um centro de gravidade imenso, arrasta galáxias inteiras para o seu interior. E podemos ter um na Europa. Veja bem que não é o risco de algo simples como uma explosão atômica, ou a destruição total do planeta Terra, mas o risco de criar uma coisa que pode aspirar toda a Via Láctea. Imagine se o Maradonna fosse viciado em corpos celestes. É isso: VUPT! E lá vamos nós pra dentro da narina do buraco negro.

O responsável pela brincadeira disse que, caso o buraco negro seja criado, ele será microscópico e instável e sobreviverá 0, 000...1 segundo (são dezesseis zeros). E, nesse tempo, ele não pode fazer um estrago muito grande. Talvez inale um átomo e dois e pronto.

Mas e se essa porra ficar estável, cidadão? E se não se desfizer?

Aí ele disse que a tendência é que o Buraco negro continue viajando em dez vezes a velocidade da luz e que só vai dar merda há alguns milhões de anos-luz daqui. Já estou até vendo os cabeçudos do planeta do E.T. putos da vida com a gente. Escreve o que estou dizendo que essa história vai acabar em invasão alienígena. Se alguém larga um buraco-negro na minha porta, pode ter certeza de que vou interpretar como um ato de guerra. Se os caras escaparem, vai dar rolo.

Mas e se essa porra trombar com um nêutron ou um quark, perder a velocidade e chegar, no máximo, em, sei lá, Luziânia?

Aí ele vai ser atraído pela gravidade da Terra.

Ah, certo. Podemos ter um buraco negro no centro da terra. Mas e aí?

Aí ele vai começar a sugar matéria.

Não poderia ser melhor. E aí?

Bom, eventualmente ele sugaria toda a Terra e a Via Láctea, mas isso demoraria uns seis bilhões de anos e a Terra só vai viver mais cinco bilhões, mesmo.

Então quer dizer que, se por um acaso a gente conseguir dar um jeito de evitar que o Sol se apague, não vai adiantar nada?

O cientista diria que, em primeiro lugar, é pouco provável que o buraco negro se forme e que, caso isso aconteça, é praticamente impossível que ele se aloje no centro da Terra. Praticamente impossível, Né?

Hnf... Foi o que disseram quando o Lula pensou em se candidatar à Presidência da República pela primeira vez.


 

O caminho

Sempre preguei o pessimismo e sempre fui um incompreendido. Pois bem, acabou de sair um estudo que prova que o verdadeiro caminho para a felicidade é o pessimismo.

O pensamento positivo e o otimismo ajudam você a conseguir seus objetivos, mas quando você chega lá, as coisas não são exatamente como você pensava, não é mesmo? Vem a decepção e certa depressão é inevitável antes que você chegue à conclusão de que o que você precisa mesmo é de outro objetivo. E mais outro, e outro, e outro...

Já o pessimista sabe exatamente sabe que as possibilidades do pior acontecer quando ele chegar lá são grandes. Então, qualquer coisa boa é lucro e vai ser encarada com deliciosa surpresa. E pronto: felicidade.

O otimista acha que tudo tem jeito e, quando assiste ao estupro de crianças e o espancamento do jovem que saiu da boate no telejornal, se vê sem argumento para justificar a vida, se deprime e se engana até se abraçar com uma nova ilusão.

O pessimista sabe que o mundo vai acabar e já desistiu da humanidade tem um tempo. Quando vê qualquer coisa agradável, não consegue segurar um sorriso, mesmo que seja cínico. Mas não se deixa enganar: seja lá o que for que viu, era apenas a exceção que confirma a regra.

Já o deprimido usa a visão do pessimista para justificar sua permanente tristeza que, na verdade, não tem motivo nenhum.

Sei que já é a décima vez que falo sobre isso aqui e provavelmente vocês já estão de saco cheio. É bem provável que ninguém goste dessa crônica e que eu acabe perdendo mais leitores por insistir no tema. Pelo menos, isso é o que eu acho que vai acontecer – mas provavelmente vai rolar algo pior ainda. Se não acontecer, é lucro.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Uma pequena Indiana Jones

Nesse ano, a minha maior surpresa com o Indiana Jones veio de uma fonte completamente inesperada: o jogo Indiana Jones Lego. Pra quem não acompanha o que rola no mundo dos videogames, a série Lego pega filmes e personagens famosos (Indiana Jones, Star Wars, Batman) e transforma em um jogo de aventura, tudo montado com os bloquinhos Lego.
Os jogos são muito bem feitos e é impressionante o resultado final, pois, além de tudo no cenário poder ser montado e desmontado (pois é tudo Lego), os desafios são interessantes e inteligentes. E mais um detalhe: o enredo é sempre uma versão bem-humorada e censura - livre dos filmes. Os bonequinhos não falam e vários elementos são traduzidos através da expressão corporal. Para mostrar que o Indiana Jones tem medo de cobra, por exemplo, o bonequinho cobre o rosto com as mãos e se treme todo quando chega perto de uma cobrinha Lego, que parece um cocôzinho vermelho.
Tudo muito simpático, mas talvez bonitinho e “clean” demais, para quem, como eu, prefere jogos como a Conspiração Bourne, no qual você pode pegar um lápis na mesa e enfiar no olho do seu adversário – se não fosse por um detalhe: Indiana Jones lego eu posso jogar com a minha filha!
Assim como meu pai dividiu sua paixão por cinema comigo usando o Indiana Jones, posso, com o mesmo personagem, dividir minha paixão por videogames com minha filha, que vibra com cada cena do joguinho e não pára de apertar os botões nem quando os cineminhas pré-gravados do jogo são disparados. Para ela, ela continua controlando a ação, fascinada com tudo que consegue fazer e montar.
Se não fosse pela Bia, eu jamais iria perceber o tanto que um jacaré de Lego pode ser assustador. Quando o personagem dela cai no rio de jacarés, ela grita, larga o controle e tampa os olhos, pedindo minha ajuda para passar de fase.
E ela comenta as ações, briga com os bonequinhos, coordena as estratégias mais engraçadas e imprevisíveis, se diverte atropelando o meu personagem (várias vezes seguidas) e levanta a mão para um “high five” toda vez que conseguimos, juntos, superar um obstáculo.
É como ser criança de novo – exatamente o que um filme do Indiana Jones se propõe a fazer.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal

O novo Indiana Jones faz sentido. Com a cronologia da série entrando nos anos 50, época de desenvolvimento tecnológico e nos primórdios da guerra fria, a nova descoberta arqueológica do Dr. Jones se encaixa perfeitamente no tema.

Além disso, dividir a cena com o filho e reviver um grande amor também são idéias que amarram bem as tramas anteriores.

E o resto também está lá: o nacionalismo, um vilão determinado, a ação, o bom-humor e o chapéu. E esse é o problema do novo Indiana Jones: ele não surpreende – e por isso é um filme bem mais fraco que seus antecessores.

O roteiro é interessante, mas tão formulaico que você vê o que vai acontecer a quilômetros de distância. Além disso, diferente da Arca da Aliança e do graal, o novo "tesouro" já foi explorado à exaustão em uma série de filmes recentes. O resultado é que, depois de quinze minutos de filme, eu já sabia como o filme terminaria.

A inclusão do filho é interessante, mas também previsível – e são poucos os momentos que a química entre pai e filho realmente funciona (Shia LeBeuf não é o Sean Connery). E manter o suspense de que o jovem é filho dele durante mais de uma hora foi, na verdade, uma oportunidade perdida. Não contribui para a história, pois todo mundo sabe do "segredo" e diminui as cenas com o clima "pai e filho". Quando o "segredo" é revelado, não resta mais nada a não ser acelerar para o final do filme.

As cenas de ação também são o que se podia esperar (com uma ou outra exceção) e, em um caso bem específico, Spielberg errou a mão e exagerou tanto no absurdo que eu saí do clima do filme por alguns instantes.

Mas o filme diverte, especialmente na primeira metade. E eu cheguei até a levar um susto bem honesto em um determinado momento, prova de que Spielberg entende mesmo desse negócio de direção.

Mas fiquei chateado pela ausência de surpresas.

O primeiro filme foi o primeiro, e a surpresa estava justamente aí.

O segundo filme abandonou a arqueologia, uniu Indiana Jones com dois parceiros improváveis e, em alguns momentos, repetiu as fórmulas do primeiro – mas a fórmula ainda era nova o suficiente, e as cenas de ação foram coreografadas à perfeição.

O terceiro filme tinha o objetivo de dar uma geral no personagem e encerrar com chave de ouro a trilogia. Tivemos o pai do Indiana, a origem do nome, excelentes diálogos, cenas de ação criativas, o Indiana Jones novo...

Já o quarto filme só introduz como elemento inesperado o exagero. E apenas adiciona mais um capítulo na vida do herói. Em vez de filmão, ficou com cara de novela. Dessas que a gente assiste mesmo sabendo o que vai acontecer, porque já se afeiçoou aos personagens. Pra fazer um filme interessante, Spielberg e Lucas tinham que reimaginar um Indiana Jones mais velho (como Frank Miller fez com o Cavaleiro das Trevas), mas o que fizeram foi um cara ainda mais fodão que nos outros três filmes anteriores.

É o pior filme da série. O que talvez equivalha a dizer que é o pior carro na loja da Ferrari. Mas, enfim, é o pior.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Ensaio sobre a cegueira (não resisti a esse título)

Como você é uma pessoa bem informada, tenho certeza de que já ouviu falar do efeito McGurk, mas eu, que só leio a página de esportes do jornal e só assisto ao House, só descobri sobre o McGurk ontem.
Estava justamente lendo sobre o cérebro (como vocês podem constatar na crônica abaixo) quando deparei com a seguinte curiosidade: se alguém está movimentando a boca falando GA, GA, GA, GA, GA, e você está ouvindo o som de alguém falando DA, DA, DA, DA, o seu cérebro vai fazer a maior confusão e achar que a pessoa está falando BA, BA, BA, BA.
Se você achou tudo uma coisa meio idiota, acho que está no caminho certo, mas parece que dá pra tirar uma conclusão científica disso: o nosso cérebro completa informações. Em nome da praticidade, ele resolve uma situação e pronto: arquiva em assuntos concluídos, mesmo que não seja uma resolução muito correta.
Por isso é muito difícil para nós, depois que já pensamos sobre um assunto, mudar de opinião. Só te falar que você ouviu na verdade DA, DA, DA não vai ser suficiente. Para nos convencermos, temos que ver gráficos, o áudio separado do vídeo e uma longa explicação.
O cérebro processa milhões de informações e tem horas que, pro pensamento andar, não dá pra ser razoável. Por questões práticas, somos naturalmente teimosos. É o que o gordinho que escreveu o livro chama de cegueira não-intencional.
Conheço uma porção de gente que vai usar mais essa informação pra justificar a cabeça-dura.
Mas, apesar de sermos todos neurologicamente meio míopes, o velho ditado continua valendo, com uma pequena atualização: o pior cérebro é aquele que não quer ver.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

O velho Indiana

Pediram-me para fazer uma crônica sobre o novo filme do Indiana Jones. Como não vi o filme ainda e não sou de recusar pedidos, vou falar sobre os velhos.

O primeiro filme, Caçadores da Arca Perdida, assisti depois de ter visto o segundo, no saudoso videocassete (daqui a alguns dias, a palavra sai do dicionário). Claro que me diverti muito. A cena inicial é antológica, o take do doido da espada é fenomenal e nem o nazista derretendo, nem o Indiana Jones pendurado no submarino conseguem te tirar do clima do filme – especialmente se você tem catorze anos de idade.

Mas o segundo filme foi quem me vendeu o herói. Assisti com o meu pai, no saudoso cine Atlântida (estou começando a perceber um padrão aqui). E foi uma experiência tão marcante que lembro em detalhes até hoje – até do lugar onde sentei no cinema. E da conversa que tive com meu pai:

— Eca! Sorvete de cérebro de macaco! Que nojo!

— Eu comeria – respondeu o meu pai, provocador e cínico como sempre.

— Comia nada! E aquela caverna cheia de insetos! Será que era tudo de verdade?

— Claro que era! Mas eram todos insetos treinados. Eles não mordem os atores.

— Insetos treinados? Uau.

— Foi a primeira vez na história do cinema que insetos foram treinados com sucesso.

— É impressionante.

Meu pai sorriu. Eu desconfiava que ele estivesse brincando, mas me recusava a sair do clima de fantasia que o filme tinha deixado. Insetos treinados! Fenomenal!

Já o terceiro filme, foi uma experiência traumática. Combinei com minha namorada da gente se encontrar na porta do cinema e ela chegou atrasada. Quando entramos, o filme já estava na cena dos ratos.

Chegar atrasada! No filme do Indiana Jones! Terminamos uma ou duas semanas depois.

Mas o Sean Connery como pai do Indiana compensou. Estava explicado – o filho do James Bond tem mais é que ser aventureiro mesmo.

É claro que minha experiência com o Indiana Jones não parou por aí. Vi a série (meh), li os quadrinhos (bons) e fui ao show da MGM ("an exploding car never gets old", para parafrasear o próprio Indiana).

Espero que esse último filme não repita o fiasco que foram os novos Star Wars, que ainda reste alguma ousadia nas mangas de Spielberg e de Lucas. Vamos ver.

Ah, sim. Meu diálogo preferido:

Willie Scott: You're gonna get killed chasing after your damn fortune and glory!
Indiana Jones: Maybe. But not today.

Nós e o cérebro

Você e seu cérebro não se conhecem tão bem como você imagina. Para provar, visite esse link, assista ao vídeo e depois volte para continuar a ler à crônica: http://www.youtube.com/watch?v=jB9SRm2c_LA&feature=related.

É sério! Vá primeiro ver o vídeo ou o resto do texto não vai fazer muito sentido.

Pronto? OK, continuemos.

A verdade é que nosso cérebro é péssimo para realizar várias tarefas simultaneamente. Ele simplesmente não foi feito pra isso e ter o foco em duas coisas ao mesmo tempo é praticamente impossível. Por isso, é muito comum que pessoas classificadas como inteligentes sejam também distraídas, o que não significa que todo distraído é um gênio – não se animem, louras.

Dirigir e falar ao celular, chupar cana e assoviar, fazer sexo e rezar o terço são todas atividades incompatíveis de serem realizadas ao mesmo tempo, por questões puramente neurológicas, o que não impede alguns desavisados de tentar. Um estudo, inclusive, comprovou que quem dirige e fala ao celular simultaneamente está agindo mais perigosamente que um motorista bêbado. Não consegui encontrar nenhum estudo sobre a cana/assovio e o sexo/terço. E aconselho você a não digitar "sexo+terço" no Google. E, se digitar, não clicar no guia "imagens". E, se clicar na guia, não olhar a décima primeira foto.

Quem se orgulha de ser multitarefa, como eu, pode calçar a sandália da humildade. Na verdade, o que fazemos é fragmentar tarefas, interrompendo-as e reassumindo-as em curtíssimos intervalos e, provavelmente, seríamos mais eficientes se tivéssemos um pouco mais de disciplina e bom-senso.

Mas talvez não. O cérebro não é tão simples quanto parece e, na verdade, sua eficiência está ligada a uma série de fatores, como, por exemplo: sono, estresse, exercício e até gênero (sim, o cérebro feminino é mais complexo que o do homem).

Curiosamente, estou escrevendo esse texto enquanto assinto à televisão, depois de uma noite mal-dormida, sob estresse prolongado, depois de alguns meses de completo sedentarismo e, pelo menos da última vez que me olhei no espelho, ainda sou homem. Será que vai ficar bom?

terça-feira, 3 de junho de 2008

Fazendo graça

Humor é uma coisa engraçada: todo mundo tem, mas nem todo mundo sabe usar. E fazer os outros rir (intencionalmente) não é tão fácil quanto parece.

Alguns truques são simples, como gritar um palavrão a toda altura em uma sala completamente silenciosa. Dependendo do lugar, você pode até ser expulso, mas te garanto que vai arrancar umas boas risadas da platéia, pelo inusitado e pelo susto.

Mas isso vai funcionar uma vez só (tá bom, duas). O difícil mesmo é conseguir fazer rir sistematicamente, todos os dias, as mesmas pessoas. É por isso que blogs como o do kibeloco pegam seu conteúdo de outros lugares, utilizam colaboradores e, na falta disso tudo, vão pela quantidade, na esperança de que alguma coisa cause impacto. Funciona. Eu gosto de acessar o kibeloco que, como faz piada com notícia, ainda me dá a vantagem adicional de ficar por dentro do que está acontecendo. Pra mim, o site fez a melhor cobertura do caso do Ronaldinho com as travestis.

Estou escrevendo isso porque um leitor me pediu para escrever mais coisas engraçadas, como aquela crônica das mulheres distraídas.

O curioso é que aquilo não foi uma piada inventada. O texto foi enfeitado e floreado, mas aquilo aconteceu. Foi quando me toquei que, no Ninguém Perguntou, tudo o que é escrito é uma metáfora para as coisas que observo, pois o comportamento humano me fascina. E os humanos às vezes são engraçados e, às vezes, não.

Quer dizer, somos engraçados quase sempre, mas para ver isso é preciso aprender a rir de nós mesmos, o que considero uma arte e um objetivo a ser alcançado. Afinal, estou sempre procurando novas formas de rir e de fazer rir, pois o humor precisa ser refinado – quem ri várias vezes da mesma coisa não é bem-humorado, é bobo.

No fim, se a gente for parar pra pensar, o Jornal Nacional é muito mais engraçado que o kibeloco. Infelizmente.

Aniversário

Queria deixar registradas aqui duas homenagens: Ao Garfield e ao Leozinho. Os dois não se conhecem e não consigo imaginar duas pessoas mais diferentes uma da outra, mas os dois fazem aniversário no mesmo dia e, portanto, se não estão unidos pelas circunstâncias, unidos estão pelo destino.

E por mim.

Socialmente, faz tempo que não me encontro com nenhum dos dois (o Léo vejo todo dia, mas por obrigação), apesar de algumas tentativas frustradas. Mas isso não muda o fato de que o mundo é um lugar bem mais interessante com eles dentro.

Parabéns pra vocês e parabéns pra quem teve a idéia de deixar vocês circulando por aí.

Metalinguagem

Neste último sábado participei de uma partida interessante de um jogo de tabuleiro chamado Struggle of the Empires. Nele, cada jogador controla uma nação na época das colonizações e deve tentar ser o mais bem sucedido em exercer sua influência no mundo. Batalhas se seguem, dados são rolados e cartas de upgrades são compradas para simbolizar a evolução do seu império.

Mas a mecânica mais interessante do jogo é a seguinte: a partida é dividida em três guerras e, em cada uma delas, os jogadores irão se dividir em dois grupos de aliados. São alianças de conveniência, pois você ainda está tentando ganhar o jogo sozinho, mas você não pode atacar seus aliados, o que pode limitar seriamente seus planos de expansão. E o mais interessante: as alianças mudam de guerra para guerra e são definidas em leilão.

Então, quem era seu amigo no começo, pode virar inimigo ferrenho no segundo turno apenas para voltar a ser aliado no fim do jogo. O interessante é que, se você não tiver influência suficiente sobre os outros jogadores (financeira ou diplomática), dificilmente você vai conseguir manter as alianças que te interessam. Os outros jogadores vão tentar resolver os problemas deles, cooptando seus antigos aliados, e só vão te beneficiar se isso não for atrapalhá-los. Ou seja, fatores externos são determinantes na manutenção das suas amizades.

Achei a idéia brilhante e fiquei um bom tempo me perguntando de onde o designer poderia ter tirado essa mecânica tão interessante e perversa. Foi quando me ocorreu: da vida, claro. No jogo, obviamente, é mais divertido.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

O incêndio

Quando o incêndio começou, Marcos entrou em pânico e só pensou na própria salvação. Estava entre os primeiros a sair do prédio, mas, depois de alguns momentos lá fora, botou um lenço no rosto para se proteger da fumaça e voltou para o edifício em chamas. Arriscou a própria vida várias vezes e ajudou os bombeiros a remover as pessoas até o prédio finalmente desabar.

O homem com um lenço no rosto foi considerado um herói. Marcos foi considerado mais um dos que entraram em pânico – ninguém desconfiou que os dois fossem a mesma pessoa. Marcos nunca desfez o mal-entendido. Ele não havia entrado no prédio para obter glória pessoal, ele apenas fez o que achou certo.

Já o Júlio logo gritou: "mulheres e crianças primeiro!". Carregou um cachorrinho no colo, deixou um velhinho apoiar-se em se ombro. Ficou na porta do prédio, em um local seguro, direcionando as pessoas para o serviço médico. Júlio conhecia o prédio como ninguém e poderia acessar vários lugares de forma segura e tirar muito mais gente do prédio, mas ele pensou consigo mesmo: "já fiz o suficiente. Ninguém poderá me culpar se eu não fizer mais. Tirar as pessoas do prédio nem é minha responsabilidade – já ajudei bastante."

E todo mundo pareceu concordar com o Júlio, que foi considerado um herói. Muita gente, inclusive, acredita que o Júlio era também o herói mascarado.