quarta-feira, 19 de julho de 2006

O Escolhido (Parte 2)

— Pai, tem dois dragões brigando no quintal! – Gritou o Luiz Marcelo, mais animado que com medo.
— E o dragão verde acaba de dar um pau no vermelho. – Completou Michele. E ainda acrescentou, em tom professoral: - Deve ter sido uma bola de fogo de um desses dragões que incinerou a vovó. Tadinha.
Mas não havia tempo para lamentações. Neste momento, a campainha tocava novamente. Tratava-se de Sir Ostvald, Cavaleiro da Cruz Dourada, dono do dragão verde.
— Vim buscar o escolhido – disse, sem cerimônia.
— Quem? – Perguntou o Almeidinha.
— O escolhido. O Almeida.
— Almeida sou eu, mas escolhido para quê?
— Gente, será o caminhão do Faustão? – Perguntou a Tereza, olhando lá fora e vendo apenas os dragões (o vermelho caído), a vizinhança que começava a se acumular e o que parecia ser um exército de zumbis dobrando a esquina.
Luiz Marcelo estava incontrolável:
— O escolhido, pai! Igual o Frodo, igual o Neo no Matrix. Pô, velho, da aí um chute em câmera lenta, vai...
Almeidinha, que media um e sessenta e oito e pesava noventa quilos tinha a impressão de que toda a sua vida havia sido em câmera lenta, mas não sentia disposição alguma para chutar. Era preciso, primeiro, botar alguma ordem nas coisas. Aquilo tudo estava ficando fora de controle.
— Olha, seu Cavaleiro, vamos entrando que o senhor vai me explicar isso direitinho. Mas antes o senhor não prefere estacionar o dragão na garagem? Essa vizinhança não anda fácil... Tereza, um cafezinho, por favor.
Tereza nem discutiu. Sabia que, mais tarde, teria que providenciar o enterro da mãe, mas, assim como o Almeidinha, era uma pessoa prática e entendia perfeitamente a prioridade das coisas. E são raras as situações onde o cafezinho não é prioritário. Na sala, o cavaleiro Ostvald tentava explicar a situação para o Almeidinha:
— Mas o senhor não teve nenhuma premonição sobre o dia de hoje?
— Não.
— Não notou nada de diferente nos últimos dias? Sonhos estranhos? Poderes se manifestando? Alterações no fluxo de energia do planeta?
— Não, nadinha.
— Mutações?
— Pai – interrompeu a Michele, que não desgrudava o olho do cavaleiro e lamentava o fato dele não ter vindo pelado, a exemplo do presente – e aquele caroço na sua bunda? Aquilo pode ser uma mutação.
— Michele, aquilo é um furúnculo. E furúnculo não é mutação e também não é na bunda, é na parte alta da coxa. Além do mais, isso é conversa de adulto. Por que você não vai ver onde está o seu irmão? Ele e o presente desapareceram.
Desconsolado, o cavaleiro Ostvald não sabia o que fazer. Parecia que as coisas não estavam saindo conforme sua expectativa. Pensou por alguns momentos e decidiu que precisava de orientação. Tirou de sua túnica um papel amassado e perguntou para o Almeidinha, humildemente:
— Posso usar seu telefone?
— É para celular? – Indagou abrubtamente a Tereza, que chegava com a bandeja de café.
— Tetê! – Repreendeu o Almeidinha, bravo. O escolhido tava que tava.
(continua)

2 comentários:

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