sexta-feira, 26 de setembro de 2008

É tarde até que arde

Ultimamente, não tenho tempo pra mais nada. Acho que ouvi tanto essa frase nos últimos anos que acabei pegando essa doença aí – a da falta de tempo.
Os motivos são inúmeros, mas todos eles, quando ditos em voz alta, soam como desculpas esfarrapadas, inventadas de improviso e não muito convincentes. Quando os colegas cobram (porque os amigos de verdade nunca cobram nada), a resposta tende a ser genérica, para não comprometer.

— Rapaz, faz tempo que você não aprece!
— Pois é, ando numa correria!

Mentira, a falta de tempo tá tanta que não ando encontrando nem tempo pra correr. Inclusive, dei até uma engordadinha...

Mas hoje resolvi que ia arrumar um tempo para escrever. Arrumei e escrevi. Só não sei se ficou bom, porque não vai dar tempo nem de revisar.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Sem escolha

Em uma história em quadrinhos muito antiga chamada Skreemer, um dos personagens defendia a moral acima de qualquer coisa. Ele acreditava que todo homem sempre tinha escolha – e que fazer o mal era justamente isso: uma escolha – e não falta de alternativa. O homem sempre poderia escolher fazer o bem, por mais difícil que fosse.

Pois bem, o vilão da história põe uma arma na mão desse personagem e diz o seguinte: ou você mata um dos seus filhos ou eu matarei os dois. A situação era tal que ele não poderia, por exemplo, matar o vilão e nem se matar – ele só tinha essas duas opções. O cara mata o filho mais velho e enlouquece.

É um pouco como o filme A Escolha de Sofia. Enfim, uma situação limite, onde as alternativas parecem não mais existir.

O que essas duas histórias têm em comum é que elas são ficção. Eu até acredito que podemos nos ver diante de uma situação impossível uma vez ou outra na vida, mas isso não acontece todo dia e nem com todo mundo.

A maior parte das pessoas, quando diz que não tem escolha está mesmo é dando uma boa desculpa. Na maioria das vezes pra elas próprias.


 


 

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Jornalismo de verdade

Olha, jornalista é um sujeito muito sacana.

Acho que todo jornalista, antes de fazer uma entrevista, deveria recitar aquele texto (Miranda qualquer coisa) que os policiais de filme americano falam no momento em que agarram o malfeitor – e que, presumivelmente, também é dito pelos policiais estadunidenses de verdade: "você tem o direito de permanecer calado. Se abrir mão desse direito, tudo o que disser poderá ser usado contra você", e, se a entrevista for pra Veja ou pra Globo, o repórter continuaria: "... você tem direito a um advogado, etc...".

Digo isso porque não faltam exemplos de declarações tiradas de contexto e de edições mal-intencionadas, mas o pior, pior mesmo, é quando o sujeito se aproveita da humildade das pessoas só pra fazer uma sacanagenzinha. Só pra dar uma rapidinha e manter o pique.

Nesta semana, na paraolimpíada (como se escreve isso?), um atleta brasileiro cotó – o cara só tinha um braço e, mesmo assim, só até o cotovelo – e sem pernas, competiu de forma emocionante com um chinês que nem um braço tinha. Era uma prova de natação e os dois terminaram a prova dando uma cabeçada no sensor.

O brasileiro ganhou e bateu o recorde mundial – medalha de ouro para o Brasil!

Aí o FDP do jornalista foi lá pegar uma declaração do atleta brasileiro que, emocionado, não se conteve:

— A prova foi mesmo empolgante! Foi decidida na batida de mãos!

Se o editor tivesse um mínimo de consideração, cortava essa parte da matéria. Maldade, gente, maldade...

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Diálogo 2

Há muitos anos atrás, um sábio passava pela cidade de Brasília, quando foi abordado por uma pequena turba de deputados distritais:

— Ó, Sábio, precisamos da sua ajuda!

— Mas como sabem que sou sábio?

— Ora, pela barba branca e o cajado – responderam, em coro, os deputados distritais.

— Ah, sim! – exclamou o sábio, achando que ter comprado o cajado tinha sido... bem... muito sábio de sua parte, uma grande jogada de marketing.

E completou, em seguida:

— E como posso ajudar?

O deputado distrital mais velho explicou:

— Temos aqui dois amigos que não se falam mais. Estão bravos um com o outro.

— Se não se falam mais, é possível que não sejam mais amigos...

— Sim... Bom, o fato é que gostaríamos que eles financiassem nossa reeleição, mas, para isso, precisamos que eles voltem a se falar, pois o dinheiro só de um será insuficiente.

— E por que eles pararam de se falar?

— Um acusa o outro de que suas palavras são sempre mal-interpretadas.

O sábio ficou em silêncio por um longo tempo. Ele sabia que não adiantava um terceiro argumentar, pois eles também interpretariam as palavras do terceiro de acordo com sua vontade. E ele também sabia qual era o problema: um não confiava mais no outro. E o sábio também sabia (pois era bastante sabido) que a confiança, uma vez quebrada, só pode ser remontada com uma ferramenta especial, chamada humildade, que ninguém mais fabricava. Finalmente, o sábio falou:

— Podem procurar outras pessoas para financiar as campanhas de vocês!

— Quer dizer que eles nunca mais voltarão a se falar?

— Talvez sim, talvez não. Mas se um dia esses dois voltarem a ser amigos, eles terão suplantado seu próprio orgulho e terão atingido um nível de sabedoria maior que o meu. E isso significa que dificilmente eles cairão no papo-furado de um bando de deputados distritais.

Diálogo 1

— Hm... Eu não sei como dizer isso...

— Então não diga!

— Hã?

— Se você não sabe como, é melhor não dizer. Existe uma grande chance de que você faça a escolha errada de palavras e eu acabe me ofendendo.

— Mas o que eu tenho a dizer é importante.

— Importante pra quem?

— Hã?

— Se é uma coisa que está apenas na sua cabeça, pode ser importante pra você, mas, se é algo que eu desconheço, talvez não seja importante para mim. Pelo menos, ainda não.

— Sei...

— Também tenha em mente que, uma vez dito, você não pode "desdizer". Falou, tá falado – e isso pode trazer conseqüências! Especialmente se você não fizer a escolha certa de palavras...

— Sua braguilha está aberta!

— Hã?

— Sua braguilha está aberta!

— Meu Deus! Por que você não me disse antes?