quarta-feira, 31 de agosto de 2005

Comentários

Você tem paciência de assistir a todos os extras do DVD? Sou obrigado a confessar que até gosto de uma ou outra coisa. Erros de gravação, cenas adicionais, documentários que complementam as histórias do filme, etc. Mas e o tal do comentário? Será que tem alguém que assiste àquilo?
Ainda se fosse a visão do diretor ou dos atores sobre uma ou outra cena, tudo bem, mas o princípio do comentário é alguém falando o tempo todo enquanto o filme passa. É a simulação do chato que não para de tagarelar no banco de trás do cinema. Tudo bem que o chato é, normalmente, o diretor ou o astro do filme. Mas chato é chato, não importa sua posição social ou conta bancária.
Certa vez, munido de pipoca, coca light, almofadas macias e uma disposição de fazer inveja à uma criança de cinco anos no parquinho, sentei-me para assistir aos comentários de O Poderoso Chefão. Note bem, que não escolhi qualquer filme. Como uma moça de família, fiz questão de selecionar muito bem com quem seria minha primeira vez. Dormi. No Poderoso Chefão! Aquele tom monocórdio do Coppola no meu ouvido foi fulminante.
Dias depois aluguei uma fita, Meu Vizinho Mafioso, salvo um provável engano, em que os comentários vinham como opção padrão. Você ligava o DVD e, enquanto os créditos iniciais apareciam, o diretor de fotografia começava sua pregação.
Em um primeiro momento, achei que o aparelho tinha pegado uma linha cruzada com a CNN. Quando percebi o que estava acontecendo, fui até o menu opções e alterei as configurações, mas, antes de continuar a ver o filme, botei o pijama. Trauma.
Mas tudo isso prova que deve ter gente que se amarra mesmo nessa história de comentário. Tanto que às vezes acha o comentário melhor que o filme. Se você é uma dessas pessoas, vai adorar o novo endereço do Ninguém Perguntou: http://ninguemperguntou.blogspot.com/. Lá, você pode fazer seus comentários sem se cadastrar. Se não quiser comentar, ainda pode ler as crônicas e, se não quiser nem comentar e nem ler as crônicas, você deve ter recebido este e-mail por engano.
O site no 1grau, por enquanto, continua ativo também. O Ninguém Perguntou agora está igual a TV por assinatura: você tem várias opções para ver a mesma coisa.

Meias Palavras

Clodoaldo não era um sujeito particularmente curioso. Uma vez, por exemplo, achou estranho sua filha de dezenove anos chegar em casa molhada da cabeça aos pés em um dia ensolarado. Quando perguntou o que havia acontecido com a menina, ela respondeu com uma evasiva:
— Ihhhh, pai. Não começa!
E ele não começou. Não porque não quisesse contrariar a filha, mas porque não tinha curiosidade. Além do mais, a Maria Rita sempre foi muito ajuizada. E pronto. A esposa de Clodoaldo quase enlouquecia.
— Clodoaldo! Você nem queira saber o segredo que a Berenice me contou.
— E não quero mesmo. Não é segredo? É melhor não contar.
— Mas...
— Não conta, não, meu amor. E se a Berenice ficar chateada com você?
— Mas você não tá curioso?
— Não.
E a Teresa (esposa do Clodoaldo) tinha que esperar a filha voltar da faculdade para contar a fofoca. No dia que a filha atrasa, chegava a ter dores de cabeça de tanto guardar segredo.
Mas tinha uma curiosidade que Clodoaldo não conseguia controlar. Quando ouvia, sem querer, uma conversa pela metade, não agüentava de curiosidade e tinha que saber como é que a conversa tinha começado. Não tinha o menor interesse no final do diálogo, mas no seu começo. Chegava a abordar completos estranhos no meio da rua.
—...E tive que pagar três vezes mais pelo negócio.
— Pelo quê? – Perguntava Clodoaldo, de repente, quase matando a pessoa de susto.
Com o tempo, passou a controlar o impulso de falar com desconhecidos, mas a curiosidade não passava. Evitava até circular em lugares com muita gente. Uma vez foi ao shopping e por pouco não enlouqueceu. Foram dezenas de conversas pela metade.
—...No final mexia a bundinha.
—... Precisava ver a cara dele.
—... Menina, foi por pouco.
No final de quê? Cara de quem? Por pouco o quê? Para diminuir sua angústia, passou a inventar, ele próprio, os começos das conversas, tendo como referência o jeitão de quem estava conversando.
Duas mulheres de vinte e tantos anos. Devem estar falando de seus bebês:
— A Ritinha ganhou um brinquedo, mas já quebrou. Uma pena, pois o boneco cantava, dançava e, no final, mexia a bundinha.
E por aí vai. No último final de semana, Clodoaldo desapareceu. Não avisou ninguém, não levou suas roupas. Sacou cem reais no caixa eletrônico e sumiu, deixando apenas um bilhete: “... Por isso tomei essa decisão. Será melhor assim”.

terça-feira, 30 de agosto de 2005

Celular

Sempre achei divertida a cara que as pessoas fazem quando descobrem que não tenho celular, mas um colega ontem quase perdeu o controle e me agrediu fisicamente só porque não tenho um aparelhinho desses. Ele, inclusive, quis me dar um de presente que eu, polidamente, recusei. O homem me olhava como se eu fosse uma criatura de outro planeta.

Talvez eu seja mesmo. Não conheço mais ninguém que não tenha um. Minha esposa, minha mãe, meus amigos, minha faxineira. Todos carregam um telefone, para cima e para baixo, como se sua vida dependesse daquele apêndice eletrônico. Com um cego e sua bengala, as pessoas e seus celulares são inseparáveis.

Acho até legal ter a capacidade de encher o saco de quem eu quiser, na hora que bem entender. E tirar fotos e botar o tema da vitória na chamada, essas coisas. Mas acho ainda mais legal poder dirigir ouvindo música e prestando atenção no trânsito.

— Mas e se algum parente seu morrer? – Perguntou meu colega do primeiro parágrafo, tragicamente.

Até onde sei, ainda não lançaram um modelo com a tecla ressuscitar e saber de um acidente mais cedo não vai mudar em nada o que aconteceu. Não tenho pressa de sofrer.

— Mas e se você precisar de ajuda, numa emergência? – Insistiu meu indignado colega, mais comedido.

Não duvido que o celular já tenha até salvado vidas, mas aposto que coletes a prova de balas, massageadores cardíacos e presença de espírito já salvaram muito mais e nem todo mundo tem. Além do mais, não estou sendo contra o uso do celular em geral – se você acha que o troço é útil para você então, por favor, use.

Já bati o carro, já furei o pneu em lugares ermos e já passei mal e o celular não fez falta. Não dependo dele, não é a primeira coisa que passa pela minha cabeça quando estou em apuros. Quando fura o pneu do carro, em vez de ligar pro guincho, eu troco.

Sei que um dia terei que ceder. Já tive um no passado e provavelmente terei outro no futuro. Sou um cara que gosta de tecnologia: tenho videogame, meu computador é de última geração. Um dia terei um telefone móvel. Um dia, não hoje.

É que me dá uma sensação estranha quando olho em volta e vejo todo mundo com um celular no ouvido ou a tiracolo. Vocês lembram daquele filme que passava de madrugada onde quem dormia era dominado por uma raça alienígena? No fim, todo mundo ficava sob o controle dos ETs, achando que era a coisa mais normal do mundo. Você já parou pra pensar se sua necessidade pelo celular é real ou se você apenas dormiu no ponto?

Ah! Quem sou eu para criticar? Sei há muito tempo que o bom-senso perdeu a guerra para o consumismo – fui uma das primeiras vítimas. Talvez seja até por isso que eu resista tanto. Sou como o pecador que já experimentou todos os pecados, menos um – justamente o mais usual, que é pro Diabo morrer de raiva. O Diabo e o meu colega, claro.

sábado, 27 de agosto de 2005

Anestesia

Não sei se é porque é sexta-feira, se é efeito da idade ou uma espécie de catalepsia diante de tudo o que está aí, mas o fato é que estou anestesiado.
Nada me parece interessante. Nem os escândalos sexuais do governo Lula, nem os escândalos financeiros, nem a quantidade esdrúxula de coisas que vêm aparecendo nas cuecas dos outros, nem o Robinho na Espanha, nem a Cléo Pires. OK, a Cléo Pires continua interessante, mas o resto...
O resultado disso é que as crônicas do Ninguém Perguntou estão ficando cada vez mais espaçadas, ou então com temas amplos como a vida, a morte e o infinito. Temas que só são divertidos em pequenas quantidades ou após muitas quantidades de uísque. Quem fala disso o tempo todo ou é maníaco-depressivo ou está fazendo de tudo para ser.
Mas não estou deprimido, daí a necessidade de falar sobre outras coisas – mas sobre o quê?
Saiu no CorreioWeb que os britânicos vão lançar um estudo provando que os homens são mais inteligentes que as mulheres. Algo a ver com o tamanho do cérebro, a capacidade cognitiva espacial e a habilidade de trocar lâmpadas e pneus de carro. É o tipo de coisa que poderia dar um texto interessante, mas não seria novidade, todo mundo já sabe que os homens são mais inteligentes que as mulheres (estou entediado, mas não estou morto. Não vou perder uma oportunidade dessas de fazer uma provocação gratuita).
Teve também o furacão Katrina que saiu derrubando árvores em cima dos outros lá nos EUA. Nada novo. O fato de todos os furacões terem nomes de mulheres é legal e poderia render um texto engraçado, mas eu já satisfiz o machista dentro de mim no parágrafo acima.
Não sei se já mencionei. Dentro de mim tem um machista, um médico, um louco, o Alceu, um torneiro mecânico e uma lésbica. Eu também poderia escrever sobre isso, mas o machista já está satisfeito, o médico vai dar plantão neste fim de semana e não está a fim de trabalho, o louco está acompanhando a CPI, o torneiro mecânico pediu férias e a lésbica... Onde está a lésbica? Não sei onde foi parar, esta menina anda impossível.
O Alceu está aqui comigo, escrevendo, mas boceja a cada dois minutos. Desconfio que meu inconsciente deu uma festinha daquelas ontem à noite. Mas é apenas uma suspeita, não tenho muita consciência sobre o que acontece no meu inconsciente.
Enfim, se o problema persistir na semana que vem, passo a me preocupar. Hoje, não vou nem esquentar a cabeça. Plena sexta, vou parar de escrever e me mandar pro boliche – aposto que a lésbica já está lá, tomando uma cervejinha.

Amigos Virtuais

O blog Ninguém Perguntou foi criado há 52 crônicas atrás. Não sei quanto tempo dá isso em cálculo de gente, mas já é alguma coisa. Durante este período, cadastrei 70 leitores para os quais envio – com uma regularidade questionável – boa parte do que escrevo.

Sei que o site é acessado por uma parte desses setenta leitores e assim vamos vivendo em harmonia. Eu aqui escrevendo e vocês aí lendo.

A questão é que, até pouco tempo atrás, não tinha me dado conta que, na verdade, meu blog está hospedado em uma comunidade virtual. Uma comunidade onde as pessoas se falam, trocam idéias, namoram, enfim, se relacionam.

Nunca fiz nada disso.

Sinto-me como um Robinson Crusoé do mundo bizarro, que naufragou em uma ilha habitada - o Japão, por exemplo – só que, como não falo japonês, continuo agindo como se estivesse sozinho no meio desse povo todo. Construindo minha casa na árvore, marcando os dias no coqueiro e pescando para sobreviver. Eu não participo da tal comunidade virtual. Quer dizer, não participava. Certo dia, um dos nativos do 1grau resolveu ver que diabos eu estava fazendo ali, naquele blog, alheio ao que acontecia à minha volta.

DoceKarine foi minha Sexta-Feira. Alguém que me alertou que pode ter muito mais gente vendo o que estou fazendo e que é melhor eu parar de andar de cueca e deixar de pescar no lago com a lança e ir ao supermercado, como todo mundo. Ou seja, talvez seja interessante me adaptar.

Como o Sexta-Feira do Crusoé, ela, na verdade, não me disse nada disso, mas me mostrou o caminho com suas ações. Ela tomou a iniciativa, me convidou para ser seu amigo e mandou mensagens simpáticas. Foi muito bacana. Meu primeiro contato com a civilização virtual.

Esta crônica é meu presente para todos os anônimos que tiveram a curiosidade de vir olhar minha casa na árvore. Desculpe se não dei a atenção devida a vocês, foi pura distração. Mas podem entrar, fiquem à vontade, só não reparem na bagunça. Ainda não tem cerveja, pois tô me adaptando, mas tem coco e água de chuva. Também não reparem nos macacos, já chamei o Ibama. Mas podem entrar, sem cerimônia. E, Karine, pode entrar sem pedir licença – você já é de casa.

terça-feira, 23 de agosto de 2005

Vida

Se ainda não aconteceu com você, vai acontecer. Chega uma hora, normalmente depois de alguma experiência bem desagradável, que todo mundo se pergunta: por quê? Pra quê? De que adianta?
De que adianta tentar ser feliz, se agente morre no final? Por que o sofrimento é garantido e a felicidade uma conquista? Por que tanta gente tem que batalhar tanto só para comer? E tem a guerra e as doenças e a ganância e os meninos no sinal e o mendigo dormindo embaixo da ponte. Tem momentos que a gente olha pela janela e não entende nada. Como foi mesmo que cheguei até aqui? Como foi que vim parar nessa confusão chamada vida?
Tem gente que desiste. Sai de cena mais cedo. Às vezes suicidando sem se matar. Drogas, álcool, crime, depressão. Tem gente que não desiste, mas não consegue esconder o desânimo e o estresse. É só olhar para o lado no trânsito e você vai perceber o executivo de ar cansado, o vendedor de olhar distante, sonhando com dias melhores, a mãe gritando com o filho no banco de trás, o mal-humorado que buzina e te xinga, mesmo sendo ele o errado.
Parei para pensar nisso porque ouvi, com calma, o CD A Tempestade, do Legião Urbana. Nele, Renato Russo já estava bem doente e não conseguiu esconder sua depressão. O disco é obrigatório na discoteca de qualquer maníaco-depressivo, arruína o dia de qualquer um que prestar atenção nas letras. É bom, tem músicas ótimas, mas é melhor ouvir uma de cada vez, achei o conjunto meio devastador.
E aí resolvi ouvir o último do Queen. Freddy Mercury com a mesma doença, também nas últimas – mas que diferença de ânimo. É um CD que fala de amor, de esperança, da beleza da vida, apesar de tudo. Tem alguma depressão, mas nada grave. E só musicão.
A mesma situação, pontos de vista diferentes. No fim, a vida de todo mundo é mesmo muito parecida – é o ponto de vista que faz a diferença.
Não perca, amanhã, a visão do otimista.

VIDA 2

Já deve ter acontecido com você. Tem dias que a gente acorda mais animado do que guia de excursão. Sem nenhum motivo aparente, você abre o olho e já está de bom-humor. Seus problemas não foram embora, a CPI dos Correios vai de mal a pior e você já está atrasado pra uma reunião importantíssima com a diretoria. Mas nada te abala. Pra você, aquele copo com água pela metade está sempre meio cheio.
No seu trajeto para o trabalho, ao invés de refletir sobre sua pequenez diante do universo e sobre o preço da carne você põe a Festa no AP a todo volume e canta balançando a cabeça. Sua mente está ágil, suas respostas estão na ponta da língua. Na hora do almoço você vai ao banco e não se aborrece. Você compra um DVD pirata dos Velozes e Furiosos 2, dublado em russo e legendado em ucraniano, só para dar uma força pro ambulante. Em resumo, você está de bem com a vida.
A vida não lhe fez nada para merecer tamanha consideração. Você não ganhou sozinho na sena, não desvendou nenhum mistério do universo, não realizou nenhum objetivo pessoal. Mas hoje você é capaz de se maravilhar com as cores do Ipê roxo, de se emocionar ao ver uma mulher grávida, de estacionar e sair do carro para ver o pôr-do-sol. Hoje você é capaz de perceber que a vida é um milagre e que estar vivo é uma oportunidade. Hoje você é incapaz de fazer sexo, mas pode fazer amor até de madrugada.
Em algum momento, durante o dia de hoje, você vai perceber, com uma convicção inabalável, que tudo valeu a pena. Tudo. Todo o sofrimento seu e da humanidade – tudo vai se redimir diante de um segundo de felicidade absoluta. Um olhar, um gesto, um beijo, uma palavra. Será apenas um segundo, mas ele justificará toda sua vida.
Amanhã é, claro, outro dia. Mas hoje você não está preocupado com o amanhã.

segunda-feira, 22 de agosto de 2005

Alter Ego

Você veja só como são as coisas. Desde que comecei a escrever as crônicas do Ninguém Perguntou, passei a viver uma situação engraçada: meus amigos me confundem com meus personagens.
Só os meus amigos lêem as crônicas (são cerca de setenta leitores – quando chegar no 100 vai ter festa) e, se nem todos freqüentam minha casa, pelo menos me conhecem razoavelmente. Mas não tem jeito, já percebi que, na cabeça do pessoal, virei uma mistura do que realmente sou e do que escrevo.
É fácil entender o porquê da confusão. Tenho o hábito de escrever em primeira pessoa, pois acho mais fácil “entrar” no personagem desta forma. Ainda mais em textos curtos, que não permitem um desenvolvimento maior das características pessoais do protagonista. Mas só há pouco me ocorreu que o que os leitores viam, na maioria das vezes, era o Zinho e não o careca de trinta e poucos anos, moreno, casado, com uma filha de dois anos e que mora no Sudoeste completamente fictício que eu havia criado. O Alceu.
Pronto. Revelei meu alter ego, minha identidade secreta. Quem escreve as crônicas, na verdade, não sou eu. É o meu outro eu: o Alceu. O “Al” é de “alter” e o “eu” é uma referência ao ego. O “c” é só para confundir. Alceu! Bem legal, hein?
Como acontece com qualquer super-herói, quando me transformo no Alceu, ganho uma série de superpoderes. O Alceu pode mentir ser preconceituoso e exagerar, já o Zinho é um cara ponderado e equilibrado. O Alceu chora se descabela e fala palavrão, já o Zinho é um cara ponderado e equilibrado. Autopromoção à parte, o Alceu é tudo aquilo que eu não posso ser. Ou porque não quero ou porque ia me meter em confusão se fosse.
Vocês não deixam de estar certos, devo ser mesmo uma mistura do que sou e do que escrevo. Mas, só para evitar qualquer mal-entendido: o fato de 90% de tudo o que é escrito no Ninguém Perguntou ter a ver com sexo não é culpa minha. É do Alceu! Do Alceu!

Educação

Nesta semana tive a notícia que mais uma professora americana assediou o aluno. Dessa vez foi Pamela Rogers, de 28 anos, que teve relações sexuais quatro vezes com um menino de treze. Há alguns meses atrás foi Debra Lafave, de 24 que teve relações sexuais com um aluno de catorze – ao que tudo indica, em um carro em movimento dirigido pelo primo do rapaz, fantasia que muito adulto ainda não realizou.
Pamela conseguiu um acordo na justiça e vai ficar presa nove meses, além de perder a licença para dar aula. Debra ainda vai a julgamento e está alegando insanidade.
Só não entendi uma coisa. É crime?
Tá, tudo bem, entendo toda a história da relação de poder, da confiança depositada pelos pais, etc. Mas vamos ser sinceros. As duas são muito bonitas. Duas louras peitudas de olhos claros. Se fosse nos meus treze anos de idade e acontecesse comigo, seria uma recordação maravilhosa e não consigo achar justo alguém ir pra cadeia por fazer alguém feliz.
Qual é a opinião dos garotos? Eles se sentiram explorados ou satisfeitos? Será que a opinião deles não conta? Os psicólogos dizem que uma situação dessas pode causar danos irreparáveis ao menino. Será?
Se fosse um homem assediando uma menina, a gente não teria muita dúvida em condenar o cara – o sujeito é automaticamente um canalha. Mas com uma mulher o caso é diferente, não é? E se a mulher fosse feia? Aí também seria sacanagem com o moleque, claro. Mas aí será que o moleque iria querer e participar?
Pensamentos machistas, sociedade machista, cretinice, moral – em uma hora dessas todos esses termos ficam expostos como um fio desencapado, soltando faíscas por todo lado e, desculpe o trocadilho, deixando muita gente chocada sem muito motivo.
Olha, não vou tentar dizer o que é certo e o que é errado, até mesmo porque não tenho credencial nenhuma para isso, e, mesmo que tivesse, não saberia o que dizer. É só que, por mais que tente, não consigo deixar de ser brutalmente honesto: eu teria achado o máximo. E, se fosse com uma professora em particular que protagonizou mais de uma fantasia no passado, ainda teria sido carregado sobre os ombros e ovacionado em praça pública pelo resto da turma.

Educação 2

Após uma reflexão mais ponderada, sou obrigado a confessar que minha avaliação dos casos das professoras que andaram comendo os seus alunos lá nos Estados Unidos foi pobre e preconceituosa (se você não leu, está lá no www.1grau.com/ninguemperguntou). Ou seja, a minha cara.
Mas minha esposa leu a crônica e deu o maior rolo lá em casa, por isso estou sendo obrigado a esclarecer alguns pontos.
1- Reitero que, se aos treze anos, eu tivesse uma professora gostosa e ela quisesse transar comigo, eu teria adorado. E jamais denunciaria a coitada à polícia. Isso seria aos treze anos, obviamente, e não hoje que sou casado com uma mulher maravilhosa que não troco por nenhuma peituda de olho azul.
2 – Não acho que o fato teria me traumatizado ou afetado minha personalidade de forma negativa. Bem, talvez eu tivesse ficado meio convencido, com aquele ar de “fodão”, mas nada muito mais grave.
3 – Soltem logo essas moças.
4 – Mas elas erraram. Não porque fossem mais velhas, ou porque tenham “seduzido” o rapaz. Mas porque eram as professoras deles e quebraram uma relação de confiança que a escola e os pais do garoto tinham com elas. Da mesma forma que não se espera que o médico ou o psiquiatra transe com seus pacientes, um professor não deve transar com seus alunos. Mas acontece e também não é o fim do mundo. A punição adequada é a demissão e, talvez, a impossibilidade de lecionar novamente – cadeia é exagero.
5 – E se fosse minha filha? E se a mulher fosse feia? E se fosse um homem? E se fosse o Clinton? Todas essas hipóteses são formas descabidas de avaliar a situação. Pelo simples fato de que não foi nada disso. Não foi minha filha, não foi com o Clinton e não foi um tarado com roupa de marinheiro. Caso tivesse sido, pode ser que eu tivesse chagado à uma conclusão diferente. Estou analisando o fato pelo o que realmente é e não pelo que poderia ter sido.
6 – Quantos pais já não fizeram a iniciação sexual dos seus filhos com prostitutas mais velhas? Quantos relacionamentos já deram certo entre pessoas com grande diferença de idade? E quantos não foram para frente, mas renderam bons momentos? Temos que parar de pensar em sexo como se fosse crime, pelo simples fato de ser sexo. Aliciamento existe, estupro existe e ambos precisam ser punidos severamente. Mas comer a professora não é crime, é fantasia realizada.

quinta-feira, 11 de agosto de 2005

Artefato

Múcio Bortolini (o nome verdadeiro dele não é esse) tinha dormido mal na noite anterior. Acessos de tosse, dor de cabeça, mal estar geral.
— Gripe! – falou sua esposa, em tom acusador.
Mas Múcio sabia que era mais que isso. Achou também que estivesse com febre, embora não conseguisse provar. Toda vez que usava o termômetro o danado ficava no trinta e sete e meio. Quando, às três da manhã, teve certeza da febre (calafrios e suores), estava com sono demais e derrubado demais para pegar o termômetro, que parecia rir dele, do alto da prateleira.
Mas o pior foi o catarro. Uma coisa é tirar aquela bolinha sequinha do nariz e colar na cadeira do cinema (uma diversão secreta de Múcio), outra completamente diferente era aquele muco verde, espesso e abundante, digno de qualquer filme de ficção científica.
Quando a esposa do Múcio entrou no banheiro de repente e viu aquela gosma disforme sobre a pia, escorrendo lentamente em direção ao ralo, desmaiou. Múcio percebeu que não poderia voltar para casa sem uma solução e, resoluto, dirigiu-se ao Pronto-Socorro.
Encontrou um desses médicos modernos, bonachão, cheio de intimidades:
— Boa tarde, seu Múcio – falou, olhando o prontuário. – Diga-me o que o traz aqui. Fique à vontade, vá sentando, vá sentando. Dia lindo, não?
Múcio relatou seus males da melhor forma que pôde. O médico parecia ainda mais animado:
— Que beleza! Não deve ser nada! Uma sinusite alérgica, você vai ver. Uma bobagem. Uma coisa à toa. Mas vamos tirar um raio-x do pulmão e da face, só para ter certeza.
Lá foi Múcio, com sua tosse e seu catarro, tirar as necessárias fotografias do seu interior. Com os raios-x na mão, entrou novamente no consultório do médico.
— Não falei? – Berrou o médico, eufórico. — Não tem nada. Pulmões limpos, sadios, sem... Sem...
O médico entrou subitamente em um silêncio profundo e começou a olhar para o exame de forma atenta, experimentando vários ângulos, como se quisesse entender o que estava vendo. Múcio, impossibilitado de engolir em seco, por causa do catarro, engoliu uma melequinha, preocupado.
— O que houve, doutor? Tem alguma coisa errada com o exame?
— Não exatamente... Tem uma coisa aqui, meio ovalada, meio quadrada... É um artefato, sem dúvida.
— Um o quê?
— Um artefato.
— Um artefato... No meu pulmão?
— Isso mesmo.
— Mas, como assim, um artefato? É um rádio-relógio? Um anel de brilhantes? Um artefato? Meu Deus, de hoje não passo.
— Calma, calma, vamos pedir um laudo e ver o que é primeiro. Pode não ser nada.
— Como assim, nada? Afinal, tem ou não tem alguma coisa aí?
O médico parecia não saber o que dizer, mas, finalmente, confirmou:
— Tem.
— Um artefato.
— Pois é.
Múcio deu a notícia para a esposa com todo cuidado, mas não precisava ter se preocupado tanto. Ela ficou encantada.
— Puxa, Múcio, um artefato! Que bacana. Nunca conheci ninguém que tivesse um artefato no pulmão. Posso ver?
Múcio mostrou os raios-x.
— Olha, parece um óculos – disse ela, apontando para uma parte da foto que não tinha nada a ver com o tal artefato.
Durante uma semana, Múcio ignorou o artefato e tratou sua miséria como se fosse uma sinusite alérgica, a conselho do médico. Não melhorava, nem piorava. Às vezes ficava pra baixo, às vezes bem-disposto. O laudo já havia ficado pronto, mas ele enrolou pra pegar. À noite, sua esposa o abraçava carinhosamente, orgulhosa do marido ser tão especial e possuidor de uma doença tão rara. Ela teria uma reunião com as amigas do clube no sábado e mal podia esperar para contar a novidade. A Regininha, cujo marido tinha gota, ia ficar morrendo de inveja. Queria ver alguém superar isso. Um artefato! E no Pulmão!
Mas, na sexta-feira, Múcio ligou para ela do celular. Tinha ido pegar o laudo e queria contar a novidade para a mulher:

— Querida! Você não vai acreditar! Meus seios costo-frênicos estão livres!
— Seus o quê?
— Meus seios! Eles estão livres! Quer dizer, o seio da face está hipoplásico. Mas os seios costo-frênicos, os seios maxilares e os seios esfenoidais estão livres.
— Meu bebê... Você é homem, não tem seios. Tem, no máximo, peitos. E só dois.
— Você não está entendendo. O artefato não era nada. Quer dizer, era só uma pneumonia, mas nada grave. Meus seios e o meu mediastino vão ficar bem.
A esposa de Múcio nem teve ânimo de perguntar o que era mediastino. Mal podia acreditar que o artefato a havia deixado assim, sem mais nem menos, um dia antes da reunião do clube. Mas procurou animar-se. Se o marido aparecesse em casa à noite com dez ou doze seios pelo corpo, ela ainda seria a sensação da noite.

segunda-feira, 8 de agosto de 2005

Casamento

Não é raro encontrar um certo ar de arrependimento nas pessoas casadas. Não estou falando do arrependimento verdadeiro, que é acompanhado de brigas, desilusões e pensão alimentícia, mas de um arrependimento tímido, diluído. Algo parecido como quando pedimos um prato no restaurante e achamos delicioso – até vermos o prato que veio para a mesa do vizinho.
É isso. Um desejo incontrolável pelo que poderia ter sido. Uma mulher mais interessada em informática, um marido menos barrigudo, um filho a menos, um filho a mais. A mesma mulher – mas com outra sogra. O mesmo marido – sem a coleção da Playboy. Detalhes, como o cominho que veio no seu prato. Nada contra, mas se fosse a pimenta de cheiro do prato da mesa ao lado...
Essas coisas podem até passar pela nossa cabeça, mas não são impedimentos para quem está determinado a amar. Quem vive angustiado por estes detalhes ainda não entendeu o espírito da coisa. Ainda confunde paixão com amor. Paixão é fúria e impulso. Amar é uma decisão. Quem casa movido apenas pela paixão é como a pessoa que dá um chegue sem fundo. Fez sem pensar – e vai ter problemas mais tarde, a não ser que algo inesperado aconteça.
Não me entenda mal, a paixão é absolutamente necessária para alguém declarar que viveu. Mas o amor, a decisão consciente de amar, esta também precisa ser compreendida.
Paixão é de graça. Amar custa tempo e dinheiro. A paixão é que é cega, quem está apaixonado não vê os defeitos do outro. Quem ama, não só vê os defeitos, como ainda tem que aprender a perdoar as falhas do outro. Quem está apaixonado está tão descontrolado que freqüentemente acredita que está amando e confunde as duas coisas. Mas o amor é inconfundível. Quem está amando não tem dúvida sobre o seu sentimento.
O único problema é que, ao contrário do que diz o poeta (não o Vinícius, claro), não é eterno, ou, se preferirem, só é eterno enquanto dura. O amor precisa ser renovado com gestos, com ações, com renúncias, com palavras e silêncios. É como eu disse antes: dá trabalho.
Mas cuidado: a paixão não pode e nem deve ser menosprezada, ela é um dos principais ingredientes do amor renovado. Amar, sem, paixão, não tem a menor graça.
Quanto a mim, faço sete anos de casado neste mês e não tenho arrependimentos. Nem grandes, nem pequenos. Tive a sorte de encontrar alguém que se esforça para me amar. E que, provavelmente, jogaria seu prato na minha cabeça se eu olhasse para a mesa do vizinho.

Lesbian Chic

Dia desses... Peraí. Na verdade, foi ontem. Não sei se ontem conta como um dia desses ou se tem uma categoria específica. Vou no feeling.
Dia desses, me perguntaram o que eu achava sobre o novo seriado da Warner, The L Word. Para quem não sabe, o “L” do seriado é lesbian, ou lésbica, em português. O que me lembra uma piada ótima com um português, duas lésbicas e um estivador russo, que eu só não conto agora para não bagunçar ainda mais o início deste texto. Vamos lá, então. Com fé. Agora começa.Dia desses, um amigo me perguntou o que eu achava do novo seriado da Warner, The L Word. A trama gira em torno de um grupo de lésbicas, a exemplo daquele outro seriado que falava sobre um grupo de homossexuais masculinos do qual não lembro o nome. Pois é, é o lesbianismo em pauta, tratado com sensibilidade, seriedade, poesia e com um porrilhão de mulheres lindas e gostosas.
Honestamente, é a primeira coisa que se nota. As sapatões são bem lindinhas. A segunda coisa que me chamou a atenção foram os beijos e carícias trocados por elas durante o programa e... Ah! Lembrei! Não era nada disso. O seriado foi o começo da conversa, mas o que o meu amigo perguntou foi outra coisa. Gente, onde é que eu estou com a cabeça? Vamos lá, agora tô concentrado. Ignore tudo o que você leu até agora, pois se não estivesse com preguiça, eu mesmo iria apagar. Daqui pra frente vai fazer mais sentido. Não é uma promessa, mas vou fazer o possível. Presta atenção que vai começar.
Dia desses, um amigo meu homossexual me perguntou por que é que nós, heteros, temos essa fixação, esse tesão, por duas mulheres se beijando. E ainda mais fixação e mais tesão se elas estiverem seminuas e na nossa frente. Correndo o risco de me encrencar, pois minha mulher lê tudo o que escrevo, vou tentar responder.
Para mim, o homem consegue separar o sexo da afetividade. A gente não cobra nada da sacanagem. Não exije nada da safadeza. É por isso que eu acho que o gay também é meio promíscuo mesmo, pois é esse mesmo posicionamento nos dois lados do relacionamento.É claro que existem exceções para tudo isso que eu estou falando. Nada impede que a mulher também se comporte assim, mais descompromissada, como nada impede um relacionamento gay mais careta que o... Que o... Que o quê, mesmo?
Distraí, mas já voltei. O homem é praticamente treinado para curtir esse tipo de fantasia. Duas mulheres, enfermeira, dominadora, posição do cachorrinho. É a mulher que curte mais o óleo de massagem, o incenso, a banheira e a unha do dedão do pé cortada. É claro que um pouco de despudor agrada também às mulheres, mas conheci poucas delas que estavam dispostas a entrar no quarto e deixar o romantismo na porta, do lado de fora. Por outro lado, conheço vários homens que deixariam o romantismo algemado no porta-malas, inconsciente.
Para o homem, não há limites quando o assunto é sexo. Alugue qualquer filme explícito que você vai ver (eu recomendo Louras Contra Morenas, com a Sheryl Lynn). Todo fetiche é permitido e, no campo, nem os animais escapam.
Alguns heteros só não assumem que fantasiam com outros homens porque o preconceito é muito grande. Para as mulheres, o contato com o sexo oposto é mais natural, menos complicado do ponto de vista psicológico e, dependendo da turma que você anda, é até chique. E, se você anda mesmo com essa turma, precisamos sair qualquer hora.
Enfim, é como disse alguém cujo nome não vou lembrar agora nem por milagre: sexo é simples, complicadas são as pessoas. E eu, definitivamente, nunca mais escrevo uma crônica enquanto assisto o The L Word – essa mulherada se pegando desconcentra qualquer um.

domingo, 7 de agosto de 2005

Buterflái

Múcio Bortolini (o nome verdadeiro dele não é esse) fez o que não devia. Depois de uma rodada de sexo morno com a esposa, perguntou para ela se havia sido bom. A mulher, que andava distraída, preocupada com aquelas coisas que normalmente preocupam as mulheres, teve um ataque de sinceridade e respondeu:
— Foi...
A sinceridade, claro, não estava na resposta, estava nas reticências. A esposa do Múcio era assim: dizia muito mais quando não dizia nada. Múcio sentiu um arrepio na nuca e ameaçou fugir da cama, alegando que ia tomar um banho, mas a esposa foi mais rápida e continuou a frase antes que ele pudesse agir.
—... Mas da próxima vez a gente podia tentar algo diferente...
— Diferente? Como assim?
— Você sabe... Diferente.
Ele não sabia. Como poderia saber? Diferente é um termo muito amplo, especialmente para o que se faz entre quatro paredes. Múcio tinha um primo que uma vez tentou algo diferente com a esposa e ficou meio esquisito por uns tempos. Muito sério, com o olhar distante... E ele nunca explicou direito o que havia acontecido.
— Me surpreenda – disse, finalmente, a mulher, com um sorriso maroto que poderia significar qualquer coisa.
Naquela noite, Múcio não pregou o olho.
No dia seguinte, resolveu que não pediria ajuda a nenhum amigo, pois já havia tido uma experiência infeliz nessa área (veja a crônica Haste), mas que consultaria um profissional. Foi a um sex shop.
— Boa tarde – disse, timidamente, à atendente no balcão. Uma moça bonita, de uns vinte anos.
— Boa Tarde! Em que posso ajudá-lo?
— Eu estava procurando alguma coisa diferente – tentou Múcio, na esperança de que a palavra diferente fosse, na verdade, um código secreto entre as mulheres para uma coisa bem específica. Não era.
— Bom... Chegou hoje pra mim essa roupa do Batman, que tem um zíper superprático...
— Sei...
—... Na parte de trás da sunga...
— Não, não, não. Menos diferente, por favor. Bem menos.
— Ajudaria se o senhor me dissesse o que tem em mente.
Múcio não tinha nada em mente. Proibiu o próprio cérebro de divagar sobre o assunto, com medo de onde poderia parar. Só tinha certeza de que não queria nada que envolvesse manteiga ou outras pessoas.
— Algo que faça a minha mulher feliz – disse, sentindo-se altruísta.
— Ah! Bom, temos aqui o Extríme Pínis, Pínis é Pênis, em inglês. Ele tem trinta centímetros de altura, dez de diâmetro, quatro velocidades, textura real e já vem com pilha.
O objeto parecia mais uma arma que uma prótese. Era intimidador. Além do mais, não tinha certeza de até onde o conceito de diferente da mulher poderia se estender e achou mais prudente não ficar pelado próximo de um objeto daqueles.
— Talvez algo menos extríme. Algo mais delicado.
Os olhos da mulher brilharam:
— Tenho exatamente o que o senhor está procurando: o buterflái.
— Buterflái?
— Borboleta, em inglês.
Voltou para casa com o objeto que parecia um amendoim avantajado. Naquela noite, a esposa do Múcio viu estrelas. Mais que isso, viu constelações. Missão cumprida, apesar de tudo, sem maiores incidentes. Quer dizer...
— Múcio, querido! Você realmente me surpreendeu. Pra quem nunca usou um aparelhinho na cama, você manipulou o buterflái como um mestre...
— Foi fácil – respondeu Múcio, orgulhoso. — Passei a tarde inteira treinando com a moça da loja. Ela me mostrou todos os pontos sensíveis...
Ele não conseguiu terminar a frase. Não deu nem tempo de explicar que foi em um modelo de vagina de borracha. Dormiu no sofá por uma semana. Quase deu separação.Moral da história: Nunca fale para a sua esposa que você treina o que faz com ela com outra mulher. Mesmo que a outra mulher esteja agindo profissionalmente.

quinta-feira, 4 de agosto de 2005

A Última Ceia

O Ninguém Perguntou de hoje é dedicado a um amigo específico e à amizade em geral. Que a fonte nunca se seque.O apelido do cara é Bode. Está mais perto dos quarenta que dos quinze e ainda fala “véio" (ou véi). Tem uma fixação quase obsessiva com Guerra nas Estrelas – ou com as espadas dos Jedi, ainda não entendi direito. E ainda assim vai casar no próximo final de semana. O amor é mesmo para todos.Conheço o Bruno desde a época que ele falava “véi” e era obcecado por Guerra nas Estrelas... Hmm... É melhor reformular: ele é que é o bom nas contas, mas, se não me falha a memória, conheço-o há pelo menos uns quinze anos. Provavelmente mais que isso, mas aí já é assumir a própria velhice. Quinze anos tá bom.O importante é que o cara vai casar no próximo sábado. Já fizemos a despedia de solteiro (evento do qual quanto menos se falar, melhor), mas este não é o verdadeiro ritual de despedida. Trata-se apenas de uma tática diversionária, um truque com luzes e espelhos. Enquanto todos os olhos estão voltados para a despedida de solteiro, a verdadeira cerimônia de despedida acontece em outro tempo e local. É a Última Ceia – o almoço com os amigos no dia do casamento. Fui o primeiro do grupo a casar, e, conseqüentemente, o fundador da tradição da Última Ceia que, para nós, é um ritual quase tão importante quanto o evento cristão. Com algumas diferenças:1. Não tem lugar para Judas. Mas se alguém quiser me oferecer trinta dinheiros, podemos conversar.2. Nunca ninguém foi preso. Podemos atribuir isso mais à ineficiência da polícia brasileira que à inocência do grupo. Se fosse no Império Romano, não sei não. 3. Pão eu não posso garantir, mas, vinho, tenho certeza que nunca ninguém bebeu. E ainda bem. Se o resultado final da ceia fosse o noivo comparecer bêbado à cerimônia, a tradição não teria durado tanto.4. Ninguém usa toga. Teve uma vez que um da galera foi vestido de caubói, mas não vou citar nomes, a não ser que alguém me ofereça trinta dinheiros.5. Não tem mulher pelada. Se bem que, até onde sei, na Santa Ceia também não teve. Bom, por via das dúvidas, vou deixar esse item aí.Mas uma coisa, sem qualquer sombra de dúvida, o nosso ritual tem em comum com a celebração cristã: é sagrado. Vejo todos vocês no sábado.

quarta-feira, 3 de agosto de 2005

Haste

Múcio Bortolini (o nome verdadeiro dele não é esse) acordou um dia com uma veia do pinto saltada. Isso mesmo, não dá para fazer rodeios com um assunto desses. Estava lá, o pinto relaxado, em posição de bambu tombado pelo vento, e a veia estufada, protuberante, alienígena.
Preocupado, consultou a esposa, que o convenceu a procurar o médico com um argumento simples:
— Com o pinto assim, nem pensar.
— Mas...
— De jeito nenhum. Pode ser um tumor contagioso.
Com a perspectiva de uma greve de sexo e de ter o primeiro câncer infecto-contagioso da história da humanidade, não teve alternativa. Foi ao médico.
O Doutor, um sujeito sombrio e taciturno, debruçou-se sobre o... Problema e avaliou o pênis do rapaz metodicamente. E, enquanto observava, começou a inquirir Múcio (o nome verdadeiro dele não é esse):
— Você fuma? Bebe? Pratica esportes?
— Sim. Quer dizer, não. Não bebo enquanto pratico esportes. Quer dizer... – Múcio (o nome verdadeiro dele não é esse) estava nervoso. Você também estaria.
— Quando foi que isso apareceu?
— Hoje pela manhã.
— E por que não veio antes?
— Antes? Meu Deus! É grave?
— Vamos precisar aprofundar a investigação.
— Aiaiaiai. Como assim, aprofundar? Não, não me diga! Não quero saber!
— Não posso dizer nada sem antes uma ecografia da haste peniana.
— Hã?
O caso pedia uma ecografia da haste peniana. Múcio (o nome verdadeiro dele não é esse) estava desorientado, preocupado com sua haste peniana. E pinto era lugar para veia se manifestar, assim, sem mais nem menos? Por que não foi um aneurisma? “Se meu pinto morrer, eu vou junto” – pensava. Via o pinto como um amigo. Quem pode censurá-lo?
Mas nem tudo estava perdido. Tinha um amigo, o Montgomery (o nome verdadeiro dele não é esse), que vinha de uma longa linha de radiologistas e ecografistas (esta especialidade, eu inventei). O avô, o pai e o irmão. Se era para realizar um exame tão delicado, melhor se fosse um camarada.
— O que houve, Múcio? Você parecia preocupado ao telefone, quando pediu para que viesse encontrá-lo.
— Você é meu amigo, certo?
— Claro. Pro que der e vier. Você sabe disso. Está precisando de dinheiro?— Não, não...
— Brigou com a esposa? Se quiser ficar um tempo lá em casa...
— Não...
— Fale logo o que é. Você pode contar comigo. Qualquer coisa. Pro que der e vier.— É um exame que preciso fazer... Uma ecografia...
— Claro... Com o maior prazer.
— ... Da haste peniana.
Montgomery (o nome verdadeiro, etc.) ficou em silêncio. Depois de alguns momentos, muito sério, respondeu:
— Isso eu não faço.
— Não? E seu irmão?
— Meu irmão também não vai fazer. E nem meu pai.
— E seu avô?
— Já morreu, mas também não faria. Pô, isso é coisa que se peça?
— Eu não conto pra ninguém...
— Tá me estranhando? Eu... Olha... Preciso ir...
— Sei.
— Olha, não leva a mal, não é minha especialidade. Porra! Eu tenho cara de quem faz ecografia de haste peniana?
— Você é médico. Pelo menos conhece alguém que faz? Pode me indicar...
— Pode parar senão a gente perde a amizade. Nunca me relacionei com ninguém que faça esse tipo de coisa.
— Tá. Já entendi. A gente se fala neste final de semana...
— Vou ter compromisso.
Múcio (o nome... você já entendeu) acabou realizando sua ecografia com um anônimo e acabou descobrindo que a veia saltada era, afinal, apenas uma veia saltada e mais nada, mas seu relacionamento com Montgomery nunca mais foi o mesmo.
Moral da história: se quiser manter uma amizade, não peça para seu amigo pegar no seu pinto. Nem mesmo profissionalmente.