sexta-feira, 3 de abril de 2009

... de Assis

O que eu queria falar sobre o Machado de Assis era o seguinte: esbarrei em um artigo que dizia que o escritor tinha apenas visão parcial e me deu vontade de rir. Explico-me: não sou sádico nem insano, mas é que já ouvi falar tanta coisa de Machado de Assis que essa última me pareceu exagero. O homem era mulato, gago, epilético e agora quase cego? Se continuar nesse ritmo ele vai virar o Stephen Hawkins da literatura. Daqui a pouco ele está paraplégico, banguela e sifilítico.

Pode até ser que fosse mesmo, mas e daí? É como se a genialidade dele precisasse ser justificada de alguma forma, como se, para ser brilhante, o cara tivesse que ser absolutamente diferente dos outros também fisicamente. Como quem dá importância a esse tipo de coisa são os intelectuais, imagino que eles estão procurando isentar-se da responsabilidade de serem, eles mesmos, também geniais. Como posso ser genial se o máximo que eu tenho é sapinho? Se não fui abandonado pela minha esposa e nem tenho credores batendo na minha porta? Cadê o meu câncer e minha hanseníase? Parece brincadeira, mas o que não falta são histórias tristes de pessoas geniais e não sei se concordo que a vida de todo mundo que é inteligente precisa ser miserável.

Primeiro porque todo mundo sofre, inclusive os idiotas. Mas parece que a norma é valorizar o sofrimento de quem se deu bem, para valorizar ainda mais a conquista. Não precisa! Se o cara é multimilionário ou conseguiu dividir o átomo em dois ele não precisa ser ainda mais valorizado. Ele não precisa virar herói, ícone ou exemplo de superação. Exemplo de superação é quem consegue criar sete filhos na Favela do Vidigal sem ter concluído o primário!

Temos a mania de construir heróis sem necessidade. Vejam as histórias dos Santos católicos, por exemplo. Se pra conseguir fazer milagre tem que sofrer desse jeito, não, muito obrigado. Mas isso é outra história e eu divago, divago. E, pra ser honesto, a igreja moderna têm ressaltado o lado amável e mais alto-astral dos santos (mas não esqueçamos que boa parte desse culto ao sofrimento é herança católica).

Mas, voltando à vaca fria*, é bem possível que alguém que pense muito diferente passe por momentos de depressão e isolamento porque, afinal, os outros não compartilham sua visão das coisas, mas precisamos parar com essa história de valorizar o sofrimento, seja para justificar a genialidade, seja para criar novos mitos, seja porque vende revista, seja porque dá audiência. O sofrimento não redime ninguém, ele é só isso: sofrimento. Trazer alegria aos outros, isso sim, é digno de ser valorizado.


*A vaca fria é uma verdadeira instituição dos lugares comuns do vernáculo popular. Está aqui iniciada uma campanha pela volta da vaca fria – essa expressão é ótima!

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