terça-feira, 16 de outubro de 2007

A lente da verdade

O nobre mago andava distraído, pensando nos grandes enigmas do universo quando tropeçou e caiu. Seus óculos voaram longe, bateram contra uma pedra e se partiram, irremediavelmente quebrados. "Justo hoje", pensou o nobre mago, "que não tenho comigo meu livro de feitiços banais".

Sim, porque, verdade seja dita, com um feitiço banal, o mago poderia restaurar seus óculos e voltar a ter uma visão perfeita. Que infelicidade! E ele nem conseguia se lembrar do feitiço banal! Era tão simples - como pôde esquecer?

Mas nem tudo estava perdido, pois um pobre camponês que passava por perto assistiu a tudo e aproximou-se do nobre mago:

— Nobre mago, perdão, mas vi o que aconteceu e acredito que posso ajudá-lo. Acontece que sofro do mesmo mal e carrego comigo sempre meus óculos sobressalentes. Posso emprestá-los para o senhor, se quiser.

Mas aconteceu o seguinte: vários aprendizes de feiticeiro tinham também assistido à cena e observavam o nobre mago atentamente. O mago percebeu que pegar os óculos emprestados com o camponês seria admitir a todos os presentes que havia esquecido o óbvio, que ele já não se lembrava de algo tão banal quanto o feitiço reparador. O que pensariam dele?

O nobre mago, então, se empertigou e, gesticulando no ar, falou:

— Não se preocupe. Já fiz um grande feitiço que me permitirá enxergar por um breve tempo até que pegue meus óculos sobressalentes.

Todos ficaram admirados com o mago, pois nem sabiam que o tal feitiço existia e o mago continuou seu caminho, cego, mas com a dignidade intacta. O mesmo não pôde ser dito do camponês que ainda foi alvo de algumas risadas. Que inocência achar que o mago precisava de ajuda, justo o grande nobre mago escolhido pelo próprio rei!

E cada um seguiu seu caminho.

Moral: Para enxergar as coisas através do ponto de vista dos outros é preciso humildade. Ou: se você é convencido, melhor usar lentes de contato.

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