quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Rodrigo

Desde pequena que a Lavínia queria ter um Rodrigo. A obsessão começou lá pelos treze anos e de lá para cá, assim como ela própria, só cresceu.
Certa vez sua irmã mais velha, a Moema, apareceu em casa com um Felipe e ela gostou muito do modelo. Olhos claros, ombros largos. Mas o Felipe tinha um certo ar de superioridade que a incomodava, o que ela queria mesmo era um Rodrigo: um homem bonito, alto, forte, mas sem muita iniciativa, que era para não dar trabalho.
Ao longo da vida, a Lavínia teve que se contentar com outros modelos, inclusive um Agripino, que tinha manchas na lataria e vazava. Mas não desistiu de encontrar o seu Rodrigo.
Certo dia, na praia (um habitat natural dos Rodrigos), ela encontrou o que procurava. Jogou os longos cabelos loiros para trás e disparou:
— Seu nome é Rodrigo, não é?
— Na verdade...
— Não diga nada! De agora em diante vou te chamar de Rodrigo e pronto.
— OK.
Ela sorriu. Pela subserviência era mesmo um Rodrigo legítimo.
A vida da Lavínia com o Rodrigo não era exatamente o que ela esperava. Em primeiro lugar, a manutenção era trabalhosa e o Rodrigo passava pouco tempo com ela, por causa da malhação e do vôlei.
— Eu não sabia que os Rodrigos jogavam vôlei – confidenciou a uma amiga mais experiente, que atualmente estava com um Ricardo e um Francisco.
— Não é comum, mas muitos jogam. Mas é melhor que um Ronaldo – todos os Ronaldos jogam bola e volta e meia quebram.
— Que coisa...
— Escuta, você parece meio tensa. Quer o meu Ricardo emprestado?
— Ah, não. Obrigada.
— Olha, vou te dizer uma coisa: esses modelos muito badalados às vezes não valem a pena. Eu, por exemplo, ando muito satisfeita com o meu Francisco. Ele paga todas as contas e faz Lasanha aos domingos. E não quer transar o tempo inteiro.
— Pois é. Esse é outro problema: quando transo com o Rodrigo parece que estou transando com uma TV de plasma de 52 polegadas.
— Eu sei. Não é ótimo?
Não era. Lavínia andava por aí e não conseguia entender como é que outras mulheres, acompanhadas de modelos visivelmente defeituosos, pareciam muito mais felizes que ela. Mas quando surgia a oportunidade, ela enchia o peito de orgulho e perguntava, piscando os olhinhos:
— Eu já te mostrei o meu Rodrigo?


Essa crônica foi inspirada em fatos reais. Uma amiga recentemente me apresentou o seu namorado exatamente da forma descrita acima. É sempre reconfortante para um Emivaldo (modelo 73) saber que as pessoas continuam loucas e que o mundo continua sem fazer muito sentido.

2 comentários:

  1. Fatos reais, huh? Poderia jurar que foi inspirada por Wilde, The Importance of Being Earnest. Mas pensando bem, sua versão dos fatos é melhor. Afinal de contas, quem escreveu foi você. However...

    ResponderExcluir
  2. Outro comentario pra mesma crônica? Digamos que estou inspirado pela falta do que fazer...

    Anuncio: Emivaldo, modelo 73.
    A lataria esta meio amassada, fazer o quê, o tempo passa; a pintura na frente meio descascada, mas é genético, ou como se diz no jargão da industria, veio com defeito de fabricação; o motor, a julgar por esse blog, esta em boa forma, mesmo se funde de tempos a outros; o interior encontra-se completamente intacto, mesmo se a poeira do cinismo ocasional pode enganar os nao-especialitas.
    Preço: impagavel.
    Uma peça.
    De coleção.

    ResponderExcluir