terça-feira, 24 de janeiro de 2006

Provas

De vez em quando nos pegamos falando, até para nós mesmos, que não precisamos provar nada para ninguém. Bem, isso é o que a gente gostaria, mas não é a verdade. A não ser que você seja milionário, bonito, cheio de amigos sinceros e assexuado. Caso contrário, bem-vindo à humanidade e às nossas provações diárias.
Seja no trabalho, em casa ou na sociedade, estamos sempre sendo desafiados a provar alguma coisa. Na maioria das vezes, o desafio é silencioso. Um olhar desconfiado, um sorriso maroto, uma interjeição vaga.
— Já comi uma capa da Playboy.
— Sei...
— Um tempo atrás, tive a oportunidade de conversar com o Jimmy Cliff.
— Hm...
— Entrego o relatório hoje, sem falta.
— Se você está dizendo...
Não são mentiras, até prova em contrário, mas certas afirmações demandam uma enorme dose de credibilidade antes de serem aceitas sem restrições. E, com o passar do tempo, vão ficando ainda mais improváveis. O garotão de vinte e dois anos com o corpo em cima que tocava violão como ninguém até poderia ter ido para a cama com aquela artista famosa de Hollywood em sua breve passagem pelo Brasil, mas, meu pai? Esse senhor de meia idade, barrigudo e meio surdo? Você só pode estar brincando!
Aos trinta e dois anos, tenho muitas histórias para contar, algumas inventadas, outras bastante reais, apesar de incríveis. Mas poucas evidências. Perdi contato com as testemunhas oculares e, as fotos, não sei onde as guardei. Revivo algumas memórias nos meus escritos, pois o papel não me exige nada.
Lembrei, subitamente, de uma figura que conheci há algum tempo atrás, em uma festa suspeita que contava milhões de histórias. Não havia nada que ele não tivesse feito ou experimentado. De ser espião para uma potência estrangeira a participar das olimpíadas. As pessoas tinham certeza que ele estava mentindo, mas ouviam extasiadas suas histórias. Em um determinado momento, chamei-o para o canto e perguntei, sem rodeios:
— Nada disso que você falou é verdade, não é?
E ele respondeu, placidamente, com um sorriso:
— Essa sua pergunta prova apenas que vocês não estão acreditando em mim. Mas, até o momento, não existe prova de que estou mentindo.
— Mas você ter lutado com um tigre na Malásia me parece uma mentira óbvia.
Ele arregaçou as mangas e me mostrou, com um ar de mistério e cumplicidade, uma cicatriz no antebraço que, até onde sei, poderia ter sido feita com um tombo de bicicleta. Mas não posso provar

Nenhum comentário:

Postar um comentário